Razões pelas quais a vacina russa é polêmica

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O governo do Paraná e a Rússia assinaram memorando de entendimento que firma parceria para o desenvolvimento da vacina Sputnik V contra o coronavírus.

No futuro, o estado brasileiro e o país estrangeiro poderão trabalhar juntos no desenvolvimento de testes e até na produção da vacina.

Mas, o Paraná não descarta a possibilidade de importar a vacina russa e não produzi-la, caso a eficácia não seja comprovada. O pedido de análise ou de autorização de pesquisas ou testes ainda não foi feito à Anvisa.

Que vacina é essa?

A Sputnik V é questionada pela comunidade internacional científica, porque se sabe pouco sobre sua eficácia. O presidente russo Vladimir Putin, anunciou a descoberta da primeira vacina contra o vírus na terça-feira, 11

Ele disse que a vacina desenvolvida pelo Instituto Gamaleya de Moscou (que teria recebido aprovação regulamentar após menos de dois meses de ser testada em humanos), oferece “imunidade sustentável” contra o coronavírus. Desde a semana passada Putin diz ao mundo que estava se preparando para iniciar a vacinação em massa em seu país após testes bem-sucedidos da vacina. Segundo publicação da BBC News, a Rússia fará isso a partir de outubro.

Mas, especialistas internacionais levantam preocupações sobre a velocidade com que a Rússia criou a vacina, inclusive, ela não faz parte da lista da Organização Mundial de Saúde das seis vacinas que alcançaram a fase três dos testes clínicos –, que envolvem testes mais amplos em humanos — e a OMS  reforçou pedido de cautela. A Rússia não teria publicado nenhum estudo ou dado científico sobre os testes.

Credibilidade questionada

Se a desconfiança procede ou não, quem avalia é o médico infectologista Roberto Medronho, professor da Faculdade de Medicina da UFRJ, diretor de pesquisa do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho e coordenador do Grupo de Trabalho Coronavírus da instituição.

Medronho explica que uma vacina para ser disponibilizada para a população precisa passar por  três etapas de ensaios clínicos: de avaliação sobre sua segurança; se tem poder de imunização e se é eficaz eficácia, ou seja, se de fato a incidência de casos em indivíduos vacinados é menor que naqueles que usaram placebo (vacina sem o princípio ativo). E isso deve envolver milhares de pessoas.

Segundo o especialista, após a comprovação de que a descoberta não impõe riscos às pessoas e a sua eficácia for comprovada é iniciado o processo de inscrição na Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) para produção e distribuição da vacina. Isso é o que ocorrerá com as vacinas da China e de Oxford.

No entanto, Medronho aponta que os processos em relação às vacinas contra o vírus, que já matou no Brasil mais de 100 mil pessoas, estão mesmo acelerados pela gravidade da situação. Mas, de qualquer forma, é uma situação que gera preocupação. “Agora, no caso da vacina Russia existem dois problemas, O primeiro deles é que o processo foi aceleradíssimo. Isso nos preocupa. O outro é a falta de publicação na literatura científica internacional dos resultados dos testes, mesmo que parciais obtidos até o momento”, disse ele.

A publicação científica é fundamental, segundo o professor, porque o estudo é revisado por outros pesquisadores e cientistas do mundo todo, o que gera segurança de que realmente as etapas estão sendo cumpridas de forma adequada. E a partir disso se pode iniciar a vacinação na população com tranquilidade.

“E ainda assim não acaba (a fase de testes) porque, mesmo depois da fase três, com sucesso da aplicação da vacina em milhares de pessoas, há a fase quatro, de vigília após a comercialização: é necessária a aplicação em milhões para efetivamente se saber se é realmente eficaz e segura, e se não produz efeito colateral importante”, acrescentou Medronho.

“O problema principal não é de onde vem a vacina, ela pode russa, chinesa, mas informações são fundamentais para que possamos aplicar na população uma vacina que resolva o nosso problema”.

Bem público

Outro aspecto que destaca é que, nos acordos comerciais como estes é preciso incluir a transferência de tecnologia. “Na verdade propugno que a vacina, seja ela de onde vier, passe a ser considerada como um bem público e toda população do planeta tenha acesso. A vacina não deve ficar apenas nas mãos dos países que podem comprá-la. Trata-se de uma pandemia extremamente grave e uma crise que não é só de saúde, mas humanitária”, chamou a atenção Medronho.

“Óbvio que qualquer vacina nos deixa muito esperançosos, mas também muito cautelosos porque é preciso precaução. Acho que os prazos estão sendo muito encurtados e quanto mais rápido mais problemas potenciais podem ocorrer”, alertou, avaliando que embora a notícia seja alegre, pessoalmente acredita que a disponibilidade de uma vacina eficaz e segura para aplicação na população é pouco provável que se dê antes do segundo semestre de 2021.

 

 

 

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