Pela segunda vez a reunião na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados para a apreciação do parecer pela admissibilidade da reforma administrativa – PEC 32/2020 – foi adiada. A primeira porque o governo não tinha segurança de ter os votos suficientes para aprovação e, desta vez,  para “sanar” inconstitucionalidades flagrantes da proposta.  Nova reunião foi marcada pera segunda-feira, 24 de maio, às 9h. A votação do parecer está prevista para terça-feira, 25.

O relator da PEC, deputado federal Darci de Matos (PSD-SC), alegou que o adiamento foi resultado da sugestão de vários parlamentares e combinado com a presidente da CCJ da Câmara, deputada Bia Kicis (PSL/DF), bolsonarista de raiz. 

“Muito provavelmente o relator foi informado e finalmente convencido da inconstitucionalidade do texto proposto em mais esse ponto. Mais uma vitória da pressão e das denúncias das entidades e partidos de oposição”, comemorou Vladimir Nepomuceno, assessor da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público.

Mas o especialista em serviço público alerta para a manobra do relator. “Precisamos nos manter atentos, seguindo com a pressão sobre os parlamentares e suas bases eleitorais nos estados. A retirada de falsos princípios do texto não diminui a gravidade da proposta, nem impede a privatização do serviço público. Temos que alertar os companheiros (as) que o governo pode, mais uma vez, estar cedendo os anéis para manter os dedos, como lembrou o amigo Max Leno, do Dieese, em Brasília”. 

Mudanças

Desta vez foi alterada pelo relator a redação proposta para o artigo 37 da Constituição Federal. Na nova versão Darci de Matoso propõe retirar do texto da PEC 32 os “novos” princípios da “imparcialidade”, “transparência, inovação, responsabilidade, unidade, coordenação, boa governança pública” e “subsidiariedade”. Segundo ele, os termos eram vagos e dariam margem para o “ativismo do Judiciário”, conforme publicou o jornal Valor Econômico.

Vladimir Nepomuceno avalia que ainda é pouco, em relação às demandas dos servidores, mas vai na linha do que as entidades e parlamentares contrários à PEC 32 vem denunciando desde o início. “Além da fragilidade jurídica, inverteria a relação de principal e subsidiário entre o Estado e a iniciativa privada. Hoje vários direitos sociais são obrigação do Estado, com a iniciativa privada atuando subsidiariamente. Se mantida a redação proposta para o caput do artigo 37 da Constituição Federal, a iniciativa privada teria a precedência, deixando o Estado atuando de forma subsidiária”, afirmou.

Nepomuceno aponta uma mudança importante em relação as áreas de saúde e educação. “A obrigação primeira de garantir esses direitos de forma a atender toda a população e com qualidade é do Estado. A iniciativa privada entra de forma complementar. Se mantido o texto original da PEC 32, a iniciativa privada assumiria o que desejasse, cobrando pela prestação dos serviços, deixando o poder público atuando apenas onde não houvesse interesse para o setor privado”.

Fôlego

O deputado Rogério Correia (PT-MG), um dos coordenadores da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público, falou sobre o adiamento da reunião sobre a PEC 32/2020 e os seus prejuízos ao serviço público e à população pobre no plenário da Câmara dos Deputados. Ele ressaltou a campanha pelo adiamento desta discussão durante a pandemia.

“Hoje na Comissão de Constituição e Justiça a votação foi adiada, isso nos dá um alívio porque estava preparado o trator aqui em prejuízo do serviço público e sempre a favor do mercado. Os trabalhadores do serviço público e nosso povo brasileiro ganharam um tempo para pressionar deputados e deputadas da CCJ.”

O parlamentar do PT falou da expectativa da campanha pelo adiamento.

“Eu espero que essa PEC seja retirada de pauta pela presidência da Casa, pela mesa da Câmara Federal. Porque não é possível deputado discutir um problema tão grave em plena pandemia. Como nós vamos conversar com os parlamentares e fazer audiência pública com a presença das assessorias dos sindicatos que estudam o assunto?”, inquiriu.

Rogério Correia classificou a PEC 32 como uma covardia com a Constituição e com o trabalhador público.

“Não é possível nessa pandemia se fazer essa covardia com a Constituição brasileira. Porque é uma mudança muito profunda. Ali se mexe com a estabilidade, com concurso público, se mexe com a vida das pessoas, com as carreiras, promoções, progressões. Querem colocar um servidor público de segunda categoria, aquele que terá apenas um prazo determinado, indicado por um prefeito, um governador, por um presidente da República e depois descartado como lixo!”

No fim de sua fala, Correia ratificou a campanha pelo adiamento da PEC 32/2020 durante a pandemia.

“A Frente Parlamentar Mista do Serviço Público está com um abaixo-assinado. Eu peço a todos que procurem e assine esse abaixo-assinado. Nós já temos quase 70 mil assinaturas e queremos entregar ao presidente da Câmara, deputado Arthur Lira solicitando que durante a pandemia não se faça esse debate aqui na Casa, para que ele seja feito com cuidado”.