Diretor do documentário “O Povo Pode?” fala sobre a esperança da volta de Lula à presidência

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“Lula é estadista. Tem capacidade de afirmar a democracia e não temer a luta”, diz Max Alvim

José Eduardo Bernardes 17 de Maio de 2022 às 08:35
Alvim já dirigiu diversos documentários, entre eles Cuba Jazz, que conta a história do gênero na ilha caribenha. – Divulgação

Estreou neste mês de maio, o documentário O Povo Pode?, do diretor Max Alvim. O longa acompanha a Caravana Lula Pelo Brasil, de 2017, quando o ex-presidente Lula (PT) fez percursos, de ônibus, por quase todo o país, um ano antes da campanha eleitoral que levaria à presidência da República, Jair Bolsonaro (PL).

O filme mescla cenas da caravana que passou pelo nordeste brasileiro, com depoimentos de personagens da região que, de alguma forma, tiveram suas vidas transformadas por políticas públicas implementadas durante os governos petistas, entre os anos de 2003 e 2016.

A princípio, o longa-metragem não teria Lula como personagem principal, mas os eventos que se seguiram à caravana, como a Operação Lava Jato, a prisão do ex-presidente na sede da Polícia Federal em Curitiba, e a anulação das provas colhidas pelo ex-juiz Sergio Moro, mudaram os rumos das filmagens.

“Acabou que O Povo Pode? se tornou um documento histórico do que aconteceu com o Brasil de 2016. E ele faz isso por meio das vozes de trabalhadoras e trabalhadores”, afirma Max Alvim, diretor do filme.

“Aqueles mesmos que eu estive lá atrás, em 2017, eu segui filmando, eu segui voltando aqui para o nordeste, encontrando esses personagens e com eles dialogando o que estava acontecendo no Brasil”, completa.

Com recursos captados via financiamento coletivo e, segundo Alvim, por meio de emendas parlamentares, o filme não visitará salas de cinema. A ideia, aponta o diretor, é que as exibições sejam sempre públicas e abertas a moradores de regiões carentes do país.

“A distribuição do nosso filme segue um pouco a própria lógica que constituiu o conteúdo do filme, essa afirmação da potência do povo. Nesse sentido, a gente tomou a decisão de fazer uma distribuição heterodoxa que é: “vamos exibir esse filme sempre em praça pública, em espaços públicos, de forma gratuita e, de preferência para as populações mais vulneráveis, que nunca têm acesso ao cinema”, diz o diretor.

“Obviamente, eu não sou contra outros cineastas que exibem os seus filmes em salas de cinema. As salas de cinema são espaços espetaculares para o audiovisual. No entanto, eu sou a favor de uma cultura genuinamente gratuita, genuinamente democrática e na nossa percepção, o filme era uma oportunidade de fazer isso”.

Convidado desta semana do BDF Entrevista, Alvim, que há mais de 30 anos trabalha no audiovisual brasileiro e é diretor de diversos documentários, entre eles Cuba Jazz – que conta a história do gênero musical em Havana -, também fala sobre a esperança popular com a possível eleição de Lula, o poder do cinema e destaca o clima beligerante que pode marcar esse período eleitoral.

“Acho que nós vamos viver, em 2022, essa experiência de uma sociedade cindida, quebrada, e nós vamos viver isso de forma muito intensa. A minha leitura é que a eleição vai ser muito dura, muito selvagem. Sem dúvida, eu me preocupo, inclusive, com a segurança do ex-presidente Lula nessas andanças”, afirma.

Confira a entrevista na íntegra:

Brasil de Fato: Você lançou, neste mês de maio, o documentário O Povo Pode?, que intercala cenas da caravana do ex-presidente Lula pelo Nordeste com o depoimento de pessoas da região, que tiveram a vida, de alguma maneira, transformada pelos anos do PT na presidência da República. A tua ideia inicial era produzir uma reportagem sobre a caravana. Onde mudou a chavinha e você decidiu que o registro valeria um longa-metragem? 

Max Alvim: O filme nasceu em 2017, na caravana do ex-presidente Lula pelo Nordeste, vocês se lembram que esta foi a primeira das caravanas, chamada Caravana Lula pelo Brasil, que circulou boa parte do país.

O nosso raciocínio original era fazer um road movie, um filme feito na estrada, que acompanhasse a caravana, mas que não tivesse o olhar especificamente para o presidente Lula. Na época, a gente dizia que o ex-presidente era um estadista de uma estatura tão grande, que não havia necessidade de mais um documentário contando os bastidores da vida do presidente Lula.

A gente falou: e se a gente fizesse diferente, fizesse um filme que olhasse o Brasil através do olhar do Lula? O que o Lula vê que gera política pública social, política pública vocacionada para as populações mais vulneráveis?

Então seguimos acompanhando a caravana, mas sempre observando a população que estava ali, buscando personagens, trabalhadores e trabalhadoras, que pudessem nos contar como eram as suas vidas antes dos governos do presidente Lula e Dilma, e como é que aquilo estava se desenvolvendo, especialmente porque estávamos em 2017 e já tínhamos vivenciado o golpe de 2016.

Só que quando a gente termina as filmagens – foram 36 dias iniciais de filmagem, 20 com o presidente e mais 16 em que a gente voltou pelo mesmo percurso do presidente, mergulhando na vida desses personagens – a gente conclui essa etapa e volta para São Paulo.

Para quem não conhece cinema, vale dizer: você filma muitas horas e passa por um processo que a gente chama de decupagem, o processo de assistir o material, para daí sair o roteiro da montagem final do filme.

Em janeiro vem a decisão do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), condenando o ex-presidente à prisão. E a gente fala: “aqui aconteceu uma coisa e não dá mais para a gente seguir com o documentário como a gente tinha a ideia original”. Era preciso acompanhar os rumos do país.

E assim nós seguimos filmando, sempre na expectativa de que o documentário se resolvesse, que na verdade, o país se resolvesse rapidamente, para a gente ter uma conclusão. O presidente Lula foi preso e nós seguimos filmando e aquilo não acabava.

Na sequência vieram as eleições trágicas de 2018, com fake news, todo o discurso de ódio que o Bolsonaro trouxe para a eleição, com todas as puxadas de tapete que nós brasileiros levamos naquela eleição, de vários setores. E seguimos nesse percurso. Eu estive em Curitiba, filmei o presidente lá na Polícia Federal, depois a saída do presidente e assim seguimos até 2021.

A data de corte, que a gente realmente falou: “bom, agora temos, digamos, um recorte histórico importante e que se resolve. E foi por volta de junho, julho de 2021, quando sai o resultado do Supremo Tribunal Federal, definido que o ex juiz Sergio Moro foi parcial no julgamento e desmontando toda a peça, toda a farsa jurídica que se fez contra o ex-presidente.

Então, acabou que O Povo Pode? se tornou um documento histórico do que aconteceu com o Brasil de 2016. E ele faz isso através das vozes de trabalhadoras e trabalhadores. Aqueles mesmos que eu estive lá atrás, em 2017, eu segui filmando, eu segui voltando aqui para o nordeste, encontrando esses personagens e com eles dialogando o que estava acontecendo no Brasil.

Sobre a exibição do filme, a ideia é que ele fique fora das salas de cinema e seja itinerante, com apresentações gratuitas. É isso mesmo, Max? 

A distribuição do nosso filme segue um pouco a própria lógica que constituiu o conteúdo do filme, essa afirmação da potência do povo. Nesse sentido, a gente tomou a decisão de fazer uma distribuição heterodoxa que é: “vamos exibir esse filme sempre em praça pública, em espaços públicos, de forma gratuita e, de preferência para as populações mais vulneráveis, que nunca tem acesso ao cinema.

Obviamente, eu não sou contra outros cineastas que exibem os seus filmes em salas de cinema. As salas de cinema são espaços espetaculares para o audiovisual. No entanto, eu sou a favor de uma cultura genuinamente gratuita, genuinamente democrática e na nossa percepção, o filme era uma oportunidade de fazer isso.

Nós lançamos o filme no dia 4 de maio, em São Paulo, dentro de um espaço popular que é o galpão do MST, em São Paulo e, na sequência, saímos em caravana, digamos, inspirados pelo ex-presidente Lula. No dia 7 de maio exibimos ele aqui na comunidade de Brasília Teimosa, em Recife, onde eu estou hoje.

Uma sessão linda, em praça pública, para algumas centenas de moradores da comunidade. E hoje mesmo eu estou seguindo para São Luís, aonde a gente vai fazer a exibição no maior quilombo urbano do Brasil e assim seguiremos, de capital em o capital, exibindo o filme.

O mais importante é que, em cada capital que a gente exibe, eu tenho brincado que carrego um saco de pendrives, entrego para as lideranças dos movimentos populares, dos sindicatos, as mais diversas lideranças que existem a depender do local, às vezes é um quilombola, às vezes é um indígena, tanto faz. Eu entrego para eles o pendrive com o filme, para que eles possam ampliar essa distribuição de forma gratuita e generosa com suas comunidades.

Assim, a gente vai, aos pouquinhos, fazendo uma exibição do filme, não a partir das redes sociais, inicialmente, mas a partir de exibições realmente presenciais. Porque também é critério para a gente a ideia de produção, de encontro. A ideia de produção de coletividade, a ideia de produção de comum, de comunidade.

E o cinema tem essa potência, quando a gente exibe isso para uma comunidade, a gente dá a oportunidade para ela de, aproveitando o filme, produzir debate, produzir reflexão e produzir isso que eu estou chamando de encontro. Fazer com que ela se fortaleça através da exibição do filme.

Mais do que o filme, para mim, muito mais importante do que qualquer obra, é a ideia de cidadania, é a ideia de construção de comum, de comunidade.

Voltando um pouquinho para a história que permeia o filme, há um antes e um depois dos governos Lula para o povo do Nordeste, principalmente. Como é que foi acompanhar de perto a caravana do ex-presidente por essas cidades e ouvir a história desses personagens, que retratam um país que viveu um período de grandes mudanças? 

Eu tenho dito que a experiência de fazer O Povo Pode? transformou a minha vida. Eu tenho a sensação de que isso está no filme. Minha grande expectativa é que o filme transforme vidas como transformou a minha.

Por muitos motivos, desde a experiência de acompanhar, na filmagem, a caravana, que em si, foi uma experiência incrível, porque o Lula tem…eu sempre brincava, na época, que o Lula tem um imã. Onde ele passa, não só as pessoas vão até ele, como todas as câmeras se voltam para ele.

Eu ficava o tempo todo puxando a orelha do meu diretor de fotografia dizendo para ele: “não é ele que eu quero que você veja”. Porque toda hora, quando você vê, você já está no Lula, você já vira a Câmera para ele. Porque ele tem essa coisa magnética.

E ele tem uma coisa muito bonita, que talvez tenha nos ensinado a filmar de outro modo: o Lula é aquele cara que está em uma multidão e ele tem uma capacidade de sempre ver no meio da multidão, a pessoa mais frágil, a pessoa que mais está precisando de um abraço e é nela que ele vai. Isso é uma sensibilidade aguçada nele, é impressionante.

Eu fiquei 20 dias com esse cara, 50 e poucas cidades nós rodamos, e o tempo todo era assim, o tempo todo. O Lula estava lá, observando o mais frágil, então a gente tentou também, de certo modo, nos contaminar dessa lógica, de observar o mais frágil e tentar construir com ele um diálogo para entender que perspectiva essa fragilidade tem, em relação à nossa democracia.

Acima de tudo, acho que quando você se dispõe a entrar num filme sem ter nada para provar, o faz exclusivamente para ter uma escuta do que está acontecendo, você não está saindo de casa com um objetivo de construir um institucional sobre nada, você está saindo de casa com o objetivo de compreender o que está acontecendo no país, o retorno que se tem dessa experiência é muito gratificante.

Porque encontra percepções, leituras, facetas do Brasil que você não tem no dia a dia, na tua comunidade, na tua bolha. Isso é uma lição de vida, da gente sair das bolhas, encontrar outras perspectivas, aprender com elas e, acima de tudo, respeitar a diferença. Tudo o que a gente não vê neste governo fascista, com o perdão da digressão.

Eu tive a oportunidade, inclusive, de cobrir uma caravana do ex-presidente Lula em 2017, na região sudeste. E como você falou, havia muita euforia e um sentimento de agradecimento por onde ele passava. Mas também, e acho que não foi o caso da caravana do Nordeste, pelo que eu sei de registros, havia um pequeno clima de tensão, que acompanhava o percurso. Na caravana pelo Sul do país, inclusive, o ônibus chegou a ser baleado. Você acha que esse clima beligerante está reverberando na nossa sociedade agora e pode chegar nesse eleição? A ideia é que o ex-presidente volte a caminhar pelo país.

Eu acho que sim. Eu dizia, já naquela época, que talvez o maior dano do Bolsonaro, não era o Bolsonaro, era o bolsonarismo. Porque a ideia que ele preconiza é uma ideia fundada na desigualdade, fundada na ideia de que eu preciso aniquilar aquilo que é diferente de mim.

Em 2017, como você disse, aqui no Nordeste, durante a caravana, isso foi quase invisível, porque aqui há uma hegemonia do Lula, do carinho do povo pelo Lula. Porque, como você também disse, há um agradecimento, um sentimento de gratidão muito forte do povo nordestino em relação ao que o Lula fez por eles, ao longo dos seus governos, e depois dos seus governos também, através da presidenta Dilma.

Acho que nós vamos viver, em 2022, essa experiência de uma sociedade cindida, quebrada, é nós vamos viver isso de forma muito intensa. A minha leitura é que a eleição vai ser muito dura, muito selvagem. Sem dúvida, eu me preocupo, inclusive, com a segurança do ex-presidente Lula nessas andanças.

Mas, eu acho que, acima de tudo, o Lula tem uma capacidade, como estadista, de sempre afirmar a democracia, de não ter medo da luta. E isso é uma lição pra gente. Quando eu o visitei e fui entrevistá-lo lá na Polícia Federal, em Curitiba, quando a gente saiu de dentro da PF, o acampamento que tinha em frente, a Vigília Lula Livre, as pessoas perguntavam: “e aí, como está o presidente?”.

E eu dizia: “o presidente está ótimo, é impressionante. Ele está ótimo. Quem está mal somos nós, a gente está aqui, todo mundo entristecido, todo mundo cabisbaixo, ele está lá dentro lutando como um louco, segue lutando lá dentro”.

Então, o presidente tem essa capacidade de não baixar a cabeça. Está claro para ele que, a única alternativa pro povo brasileiro é a luta. E isso não é por acaso, porque o presidente vem da origem que vem. O que eu ouvi aqui no Nordeste, fazendo as entrevistas de todos os trabalhadores e trabalhadoras que eu entrevistei, é que pela perspectiva de um trabalhador e de uma trabalhadora, não tem espaço para aquela depressão que nos paralisa.

Lógico que nós podemos ficar tristes, todos nós podemos ficar tristes, mas não aquela tristeza que nos paralisa. Porque, para quem está na luta desde que nasceu, não há outra alternativa a não ser a luta. E isso é uma lição que eu carrego nesse período, tanto do meu convívio com o ex-presidente, com o meu convívio com esses personagens lindos que compõem o documentário.

Inclusive, uma dessas personagens, a Vani, que mora numa região de Pernambuco, conta, junto com os pais, sobre a questão das cisternas, de como o avanço das políticas públicas fizeram diferença na vida deles. E ela revive uma expressão do Paulo Freire, “esperançar”. Você acredita que o momento é propício para a gente voltar a levar bons sentimentos para o país? Em um momento de tanto desalento, seja com a política, seja com o rumo que nós, enquanto sociedade, tomamos? 

Eu acho que, sem dúvida, até porque a gente tem, de cara, a possibilidade desta vez, de ter o ex-presidente Lula como um pré-candidato à presidência. Só isso já nos dá um alento de que a gente está de novo no jogo democrático, de lutar por dias melhores.

A Vani faz uso da palavra “esperançar” no contexto de…ela diz: “é preciso esperançar”. Eu tenho dito o seguinte…existe um filósofo que eu reputo muita importância, porque embora ele seja do século 16, ele repercute hoje de uma maneira muito intensa, nas nossas mentes, que é o Espinosa, ele diz que a esperança é uma paixão triste, porque a esperança é a ideia de que no amanhã você vai ter aquilo que você não tem no hoje.

Só que a Vani, muito brilhantemente, busca um verbo do nosso grande educador, Paulo Freire, que é a ideia de esperançar. Esperançar é diferente de ter esperança. Esperançar é produzir no presente aquilo que se espera para o futuro. Portanto, esperançar é carregar a vida da luta para conseguir aquilo que a gente merece, aquilo que a gente precisa. É um país justo e mais igualitário.

Então hoje vejo com muita esperança, a perspectiva que temos nessa eleição, da gente poder através dessa eleição, e através da nossa luta, da luta popular, investir numa ideia de país mais justo. Eu não acredito em céu, sabe José Eduardo. Esse negócio de que: “ah, nós vamos ter um dia, que vai ser um mundo perfeito.

Mas eu acredito na possibilidade das vezes tem um mundo mais justo, menos desigual, menos violento. A gente pode ter algo melhor, a gente pode transformar esse país em algo melhor. Então, é por isso que eu luto e eu acho que é por isso que a gente tem que lutar. Esta aí a base da luta do trabalhador e da trabalhadora brasileira.

O documentário, apesar de não ser o gênero mais popular, sempre esteve presente na história cinematográfica do Brasil. O Silvio Tendler lotava salas de cinema com suas cinebiografias. Hoje, o gênero já tem um pouco mais de reconhecimento, tem prêmios dedicados e está, também, em grandes premiações. Acho que ainda há alguma resistência para a realização. Como foi o processo de colocar esse filme para rodar? 

Eu não sei se eu concordo contigo, que o documentário é um gênero de baixa repercussão, ou reputação. Há uns anos atrás, eu fazia uma consultoria para montagem de uma televisão, e nós fizemos uma pesquisa no Brasil para saber qual era o gênero que o brasileiro mais gostava, quando o tema era educação e cultura. E o gênero que disparadamente ganhou, em primeiro lugar, foi o documentário.

Eu acho que o brasileiro, não só tem tradição em assistir os documentários, como também tem tradição de fazer documentários. Nós temos excelentes documentaristas, jovens documentaristas, inclusive, que produzem material de muito boa qualidade. Eu entendo que você quer dizer que, realmente, é um gênero que, a depender do formato do documentário, pode causar um certo estranhamento.

Mas eu sou documentarista há muitos anos, dirigi algumas centenas de documentários, vivi a minha vida profissional inteira fazendo documentários, sempre tendo condições para isso. Esse documentário, especialmente, foi um trabalho muito complexo, porque a gente fez questão de fazer ele a partir de um financiamento, que também seguisse o raciocínio do público.

De que maneira? Em primeiro lugar, através do financiamento coletivo, que a gente fez em parceria com o DCM (Diário do Centro do Mundo) e, em segundo lugar, através de emendas parlamentares, que são recursos legítimos, que a gente tinha ao alcance e que nós tivemos a felicidade de conseguir para subsidiar os custos do documentário.

E por serem emendas parlamentares, a gente reforçou mais ainda o caráter gratuito e universal da sua distribuição. É porque, a rigor, um produto audiovisual financiado pelo setor público, merece ser distribuído gratuitamente para todo mundo. Então nós estamos seguindo isso de forma rigorosa. Enfim, eu sou apaixonado por documentário. É até difícil falar disso porque é uma cachaça para mim.

Eu passei muitos anos da minha vida, mais de 30 anos como documentarista e acho que essencialmente é isso. Ele. Ele permite você fazer um mergulho na realidade. Na minha opinião, nunca representativa de toda a realidade. É sempre um recorte, nunca é isenta. Nós somos pessoas e, como pessoas, a gente tem opiniões. É natural que a gente tenha leituras de mundo.

Mas acima de tudo, são mergulhos que permitem à população e a todos nós, visualizar, enxergar o país por outras facetas. Na minha opinião, isso enriquece muito a experiência de leitura do país. Documentário é tudo de bom.

O povo pode, Max? 

O povo pode muitas coisas, essa é a grande dificuldade, porque eu tenho dito que, o povo pode eleger Hitler, o povo pode eleger Mussolini, o povo pode eleger um governo fascista ou neofascista como esse do Bolsonaro. O povo pode apoiar a criminalidade, não fazendo nada. O povo pode sair na rua e ver gente passando fome e não fazer nada, mas esse mesmo povo também pode tantas outras coisas.

Ele pode buscar saídas progressistas, ele pode buscar saídas transformadoras da realidade social. Ele pode eleger Lula. Ele pode eleger governos pelo mundo afora. Ele pode eleger Mandela. O povo pode tantas coisas. Então eu acho que o filme está trazendo para a população um pouco dessa reflexão e olha como isso é complexo, esse tipo de pergunta.

Por isso, inclusive, ele tem esse ponto de interrogação. Esse tipo de pergunta ele vai, como eu disse, se completar nesse encontro do filme, com sua audiência, cada um de nós vai sair do filme um pouco refletindo. Sim, eu posso, mas posso para que?

A grande questão, talvez desse século, é dentro das nossas possibilidades, das nossas potências, que mundo a gente quer inventar? A gente quer inventar um mundo do ódio? A gente quer inventar o mundo da desgraça completa? Das pessoas passando fome e o mundo do individualismo? Ou a gente quer inventar um mundo melhor?

Essa que, eu acho, talvez seja a reflexão que cada um saia do cinema, ou da sala de exibição ou da praça pública, quando assistir o filme.

Edição: Rodrigo Durão Coelho

 

 

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