61 anos de auto-organização dos TAE da UFRJ
João Eduardo Fonseca*
A história é objeto de uma construção, cujo lugar não é o tempo
homogêneo e vazio, mas um tempo saturado de ‘agoras’ (…)”
Walter Benjamim. Teses sobre o conceito de História
*
Se considerarmos a história desse modo, tal como Walter Benjamim ensina, como uma construção com laços contínuos, permanentes e profundos com o tempo presente, é o caso, então, de rememorarmos que, nesse último dia 11 de junho, a auto-organização associativa dos Técnicos-Administrativos em Educação (TAE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro completou 61 anos de existência continuada. Nessa data, em 1960, foi fundada a Associação dos Servidores da Universidade do Brasil (ASUB[1]). O aniversário merece lembrança por diversas razões importantes.
Uma delas se refere, claro, à importância que têm para as organizações coletivas e instituições da sociedade os esforços para conhecer, compreender e preservar a história dos processos e fundamentos que estão na origem de sua criação e em suas atividades ao longo dos anos. As gerações de TAE que se sucederam nesse continuum deixaram as marcas de suas percepções, de suas virtudes, seus defeitos, suas contradições, acertos, erros, limitações, conquistas e derrotas. São essas sínteses, enfim, que vão engendrando as construções do presente e as expectativas e projetos para o futuro. Conhecê-las, portanto, em suas profundidades, complexidades e significados dá clareza ao que se pensa e ao que se faz coletivamente, assim como fortalece os laços de solidariedade e consolida a identidade comum. É o desejável esprit du corps, a capacidade de um grupo manter a confiança em sua organização e em seus objetivos. É, portanto, a contraface virtuosa do corporativismo estreito, egoísta-passional, que submete os coletivos e suas instituições aos interesses imediatos dos grupos em detrimento das demandas comuns e da totalidade social.
Outra forte razão para rememorar esse percurso diz respeito à significativa soma de tempo-História dos TAE como trabalhadores em relação à tardia Universidade brasileira. Ela – agora centenária – é a matriz da existência dos TAE e, mesmo, sua justificativa sócio-histórica como coletivo profissional público a serviço da sociedade. Por isso, têm grande significado os 61 anos de auto-organização de um segmento que integra uma instituição que completou 100 anos de existência. Assim, se o centenário da UFRJ é um marco especial da história das instituições brasileiras, cuja origem remonta à chegada da família real portuguesa em 1808, a criação da ASUB, em 1960, é, sem dúvida, um momento relevante na história da vida societária interna às intuições universitárias.
Naturalmente, da ASUB (1960) à ASUFRJ[2] (1970) e desta até o SINTUFRJ (1993) houve uma soma de eventos e processos que transformaram, profundamente, o caráter e os objetivos da entidade que, há 61 anos, representa os TAE da UFRJ. A exemplo do que se deu no mesmo período no país com as organizações de outras categorias profissionais, públicas e privadas, a praxis dos coletivos de trabalhadores transformou a natureza assistencialista, recreativa e passiva de grande parte de suas organizações em estruturas politicamente ativas e engajadas na vida social, nos moldes de um novo sindicalismo crítico e combativo, forjado nas lutas de resistência ao autoritarismo e à exploração.
Como se sabe, a tradição organizativa dos segmentos universitários tem sua origem com os estudantes. Muito antes da fundação da União Nacional dos Estudantes (UNE), em 13 de agosto de 1937, foram inúmeras as mobilizações estudantis. A rigor – como uma expressão do inconformismo da classe média urbana –, sua forma organizada remonta a meados do século 19, conforme, por exemplo, ilustra o registro da fundação da sociedade abolicionista Dois de Julho, pelos acadêmicos da Faculdade de Medicina da Bahia em 1852[3].
Os professores da UFRJ criaram sua Associação – a Associação dos Docentes da UFRJ (ADUFRJ) – em 1979, em meio ao ambiente de mobilizações da sociedade que desempenharam papel determinante no processo de derrubada da ditadura civil-militar imposta com o golpe de 1964. Naquele momento, enquanto os movimentos sociais e sindicais alargavam as fronteiras da democracia e da cidadania, solapadas pela ditadura; no âmbito das universidades as movimentações vão se nacionalizando. Em 1978, ainda com caráter assistencialista e conservador, é criada a Federação das Associações de Servidores das Universidades Brasileiras (a FASUBRA). Confrontando medidas jurídicas da ditadura que fechou e proibiu o funcionamento das entidades estudantis, a UNE é reaberta em 1979 pelos estudantes, que desde o ano anterior vinham promovendo a reabertura de Centros Acadêmicos e Diretórios Centrais. Em 1981, os docentes criam sua entidade nacional, a ANDES (Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior), tornada Sindicato em 1988.
É nesse período de retomada cidadã da cena social e política do país pelos movimentos organizados e por representações dos segmentos democráticos da sociedade que nossa entidade, a ASUFRJ, vai romper definitivamente com seu caráter assistencialista e recreativo. Já a partir de 1982, sob pressão de sua base social, adotará aos poucos a natureza de efetiva representação sindical, ativa e crítica, que a converterá, em 1984, em uma Associação combativa e, em 1993, a consolidará com sua transformação estatutária em sindicato, o atual SINTUFRJ.
O “agora” a que se refere Walter Benjamim, evocado no início dessas reflexões, para nós, é, portanto, um “agora” para rememorar, revisitar o passado e revitalizá-lo em nosso presente. Como fonte essencial de nossa reinvenção; afinal, há tanto o que aperfeiçoar, criar, refazer, ressignificar. E já que “O presente é tão grande”, como ensinou o poeta, “não nos afastemos/
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas”
João Eduardo Fonseca
Técnico-Administrativo em Educação aposentado da UFRJ
Mestre em Educação
Presidente da ASUFRJ (1984-1986)
Sub-Reitor de Pessoal e Serviços Gerais da UFRJ (1985-1989)
Autor da Pesquisa e da publicação NOVOS ATORES NA CENA UNIVERSITÁRIA (1996)
Chefe de Gabinete do Reitor da UFRJ (2003-2011)
[1] Nossa universidade, como se sabe, foi criada em 7 de setembro de 1920 com o nome de Universidade do Rio de Janeiro, identidade que manteve até 1937, quando passou a chamar-se Universidade do Brasil. A atual denominação lhe foi conferida em novembro de 1965.
[2] Em 03 de dezembro de 1970, a ASUB se funde com o “Exporte Clube Cidade Universitária”, pré-existente, e se transforma na Associação dos Servidores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ASUFRJ). O novo nome atualiza a denominação da Universidade, tornada UFRJ pela Lei nº 4.831, de 5 de novembro de 1965.
[3] O Poder Jovem. Arthur Poerner, 2004.