Apenas o atual presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Camargo, entra na lista com 19 falas racistas
Levantamento realizado pelas organizações Terra de Direitos e Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), divulgado nesta terça-feira (22), aponta que desde 2019, primeiro ano da gestão de Jair Bolsonaro (PL), até 31 de dezembro de 2021, 94 discursos racistas foram proferidos por autoridades públicas no Brasil.
O estudo “Quilombolas contra Racistas” mostra que em 2019 foram registrados 16 pronunciamentos racistas de autoridades públicas de diversas esferas, no âmbito municipal, estadual e nacional, com esse número quase triplicando em 2020 e chegando a 42 casos. Já em 2021 foram 36, somando 94 em todo o período analisado.
Entre os episódios, 41% reforçavam estereótipos racistas, enquanto 25% negavam a existência de racismo no país. Titulares de cargos de direção e assessoramento do governo federal responderam por 33% dos casos, com 19 ocorrências proferidas pelo atual presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Camargo. De acordo com o levantamento, 96% dos discursos foram proferidos por homens.
“Para nós, quilombolas e população negra, é muito frequente ouvir termos pejorativos de autoridades que nos insultam e falam palavras horríveis. Escutamos de várias autoridades, desde juízes, promotores a presidente, governadores e prefeitos: pessoas que são formadoras de opinião pública e que deveriam cuidar dos direitos e das pessoas”, aponta no documento a coordenadora executiva da Conaq Celia Cristina Pinto. “Isso causa índices de violência contra pessoas negras e quilombolas.”
A naturalização do racismo
Segundo o levantamento, as eleições de 2018 constituem um período relevante para analisar o posterior aumento das declarações racistas e discriminatórias de autoridades públicas no Brasil, destacando-se o discurso do então deputado federal Jair Bolsonaro no Clube Hebraica, no Rio de Janeiro, em abril de 2017. Na ocasião, ele disse que quilombolas de Eldorado Paulista não “fazem nada” e “nem pra procriador eles servem mais”.
O Ministério Público levou o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF) apontando crime de racismo, mas a Corte arquivou a denúncia. “O discurso racista impune do então deputado federal Jair Bolsonaro é um marco simbólico de uma era em que os discursos racistas ganham visibilidade, reproduzem-se no alto escalão de cargos públicos e passam incólumes. Sem a responsabilização dos autores, cria-se um ambiente de naturalização do racismo e da utilização de interpretações frouxas do direito de liberdade de expressão para autorizar o discurso de ódio racial de pessoas que ocupam altos cargos públicos”, pontua o relatório.