Revogar normas sobre armas é insuficiente para reverter quadro criado por Bolsonaro

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Revogação deve vir acompanhada de uma nova regulamentação para sustentar o Estatuto do Desarmamento

Caroline Oliveira
Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) planeja revogar os decretos e portarias de Jair Bolsonaro (PL) que facilitaram a compra e circulação de armas de fogo no Brasil. No total, foram editados 19 decretos, 17 portarias, duas resoluções e três instruções normativas, sem o crivo do Congresso Nacional.

Especialistas em segurança pública, no entanto, afirmam que apenas revogar as medidas não é suficiente para reverter o cenário construído pelo atual governo com a flexibilização do porte e posse de armas.

Isso porque os decretos, normas e resoluções foram feitas para regulamentar o Estatuto do Desarmamento, criado a partir da Lei 10.826 de 2003, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição. Sem a regulamentação, a legislação sozinha “não para em pé”. Nesse sentido, as normas revogadas precisam dar lugar a outras regulamentações.

A lei “depende de uma regulamentação do Executivo para determinar como serão determinadas as normas de porte e posse e como serão as competências da Polícia Federal e do Exército, ou seja, os órgãos que estão ligados a essa política de controle de armas”, afirma Felippe Angeli, da equipe do Instituto Sou da Paz.

O especialista alerta que o tema deve ser prioridade do próximo governo, “porque a cada hora dessas normas vigentes, a gente está falando de munição e armas semiautomáticas de grosso calibre sendo adquiridas. Não é uma crise que dá pra esperar um pouquinho. É uma coisa que, a cada minuto, o estrago é maior. Tem um vazamento. Precisa fechar ele o quanto antes”.

Pontos que devem ser considerados nas novas regulamentações

Uma das preocupações que deve estar presente no momento de formulação dos novos regulamentos é como fazer para diminuir a quantidade de armas que passou a circular no Brasil após a flexibilização.

Com os 41 novos regulamentos editados pelo atual governo sem passar pelo Congresso Nacional, aproximadamente 1.300 novas armas são compradas por civis diariamente, segundo o Instituto Sou da Paz. Em outros termos, isso significa que o número de armamentos nas mãos de civis triplicou desde o início do governo Bolsonaro: de 695 mil para 1,9 milhão. Resumindo, este é o momento da história nacional em que mais brasileiros têm armas em suas mãos.

:: Após mais de 40 decretos de Bolsonaro, brasileiros compram 1.300 armas por dia ::

Uma das principais medidas foi a flexibilização da circulação de armas para os Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores (CACs). Na prática, um dos decretos liberou o porte de arma de fogo municiada e carregada no caminho entre o local de guarda autorizado e os de treinamento, instrução, competição, manutenção, exposição, caça ou abate.

Em outras palavras, isso permitiu aos CACs a circulação nas ruas com o porte de armas, o que é permitido apenas a algumas categorias. Com isso, a quantidade de armas registradas por CACs chegou a 1 milhão, um aumento de 65% em relação ao número em circulação em 2018: 350 mil.

Para diminuir essa quantidade, uma das medidas que poderia ser tomada é o banimento de alguns tipos de armamentos que foram autorizados pelas normas, ou seja, tornar esses produtos proibidos de circulação, como fuzis e semiautomáticas. Uma medida como esta teria de ser aprovada pelo Congresso Nacional.

Como se sabe, no entanto, pelo menos 23 congressistas foram eleitos para o Congresso com o apoio do Proarmas, o maior grupo armamentista do país, e devem formar a “bancada dos CACs”. A maioria deles são filiados ao Partido Liberal, assim como Jair Bolsonaro. O cenário no Parlamento, desta maneira, torna difícil a aprovação de projetos contra a flexibilização.

Mas existem outras possibilidades, como programas de recompra já realizados pelo Brasil. O Estatuto do Desarmamento, quando foi sancionado, criou a Campanha do Desarmamento, que consistia na entrega das armas aos órgãos de segurança pública por uma recompensa que variava entre R$ 150 a R$ 450. No total, duas campanhas deste tipo foram realizadas, uma em 2004 e outra entre 2008 e 2009, que geraram a devolução de 570 mil armas.

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