Portugal foi principal destino de militantes que estavam na Argentina após golpe de 1973 no Chile
Depois de certa desconfiança dos militantes brasileiros que estavam na Argentina “por não crerem que seria possível uma revolução à esquerda vinda de militares”, o historiador aponta que Portugal acaba se tornando o destino dos exilados brasileiros naquele momento, uma “porta de entrada” para a esquerda na Europa. “A maioria acaba por não permanecer e vão para os outros países europeus, mas os que ficam se aliam fortemente ao movimento das Forças Armadas e vão trabalhar junto aos revolucionários na concretização da Revolução nos mais diversos campos.”
Uma vez em Portugal, as organizações de esquerda brasileira logo se alinham às suas “irmãs” portuguesas: Partido Comunista Português (PCP) e Partido Comunista Brasileiro (PCB); Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e União Democrática Popular(UDP); e outros ex-adeptos da esquerda armada brasileira ligados a organizações como Movimento Revolucionário Oito de Outubro (MR-8), VAR-Palmares (VPR) e Aliança de Libertação Nacional (ALN), “que, após um longo processo de autocrítica, vão se alinhar ao Partido Socialista de Mário Soares”, explica Pezzonia.
“Este último grupo talvez tenha sido o que mais influiu na política brasileira a partir de Portugal após a Anistia e a reestruturação partidária. Foi a partir deste grupo e seu alinhamento com a social-democracia europeia, sobretudo após a chegada de Brizola em terras lusas, que a reestruturação do trabalhismo foi culminando na criação do PDT (Partido Democrático Trabalhista), bem como na introdução da social-democracia no Brasil.”
Colunista do Brasil de Fato, professor titular no Instituto Federal de São Paulo (IFSP) e militante da Resistência/Psol, Valerio Arcary foi um dos brasileiros que se exilaram em Portugal, em 1966. Ele permaneceu no país europeu até 1978. “A imensa maioria dos trotskistas da minha geração aprenderam que a luta pela revolução socialista era possível lendo livros sobre a revolução de outubro, e as que vieram depois. Eu tinha aprendido vivendo a revolução nos meses intensos do ‘verão quente’ de 1974 em Lisboa”, relatou em sua coluna sobre o retorno do exílio.
Guerras de independência e movimento negro no Brasil
Além de terem um papel central para o desgaste da ditadura fascista e influenciarem diretamente o golpe militar que deu início à Revolução dos Cravos, as guerras de independência nas colônias portuguesas de Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e Cabo Verde também influenciaram as lutas da esquerda no Brasil, em particular do movimento negro, aponta a historiadora Patrícia Teixeira Santos, docente na Universidade Federal de São Paulo e pesquisadora de Estudos Africanos na Universidade de Bordeaux na França e do Departamento de Estudos Africanos da Universidade de Dehli (Índia).
“São movimentos altamente inspiradores que vão dar força para a manutenção da luta antirracista e um reforço extremamente importante da ideia de um poder negro que ascende, de um governo negro que se estabelece com a vitória contra a exploração colonial, contra uma ditadura. Para o movimento negro no Brasil, as lutas de libertação nacional são um alento no meio da ditadura militar e o incentivo para a continuação dessa militância, mesmo na clandestinidade, de protestos e de uma série de ações.”