Qual a importância da relação entre a universidade e os movimentos sociais? Paulo Fontes, professor do Instituto de História (IH) e atual diretor da Universidade da Cidadania da UFRJ, convidou quatro representantes de movimentos sociais para o painel que debateu o tema, no Festival de Conhecimento.
Na avaliação dos ativistas a mão tem que se dupla: os movimentos têm que estar nas universidades de maneira organizada, articulada para tornar a universidade mais diversa e múltipla na relação com o conhecimento.
Participaram do debate Virginia Berriel, diretora executiva da CUT, Ariovaldo Ramos, um dos fundadores da Frente de Evangélicos Pelo Estado de Direito, Alessandro Conceição, ator e ativista do Centro do Teatro do Oprimido (CTO) e Nelson Bernardes, da direção nacional do MST no Rio de Janeiro.
Ataques
Paulo Fontes apresentou a Universidade da Cidadania, órgão suplementar vinculado ao Fórum de Ciência e Cultura (FCC) da UFRJ, que realiza atividades de formação, pesquisa e extensão na busca do intercâmbio da instituição com os movimentos sociais e conhecimentos populares. “Não tenho dúvida que a transformação que ocorreu nos últimos anos nos governos populares é agora objeto de ataque, fundamentalmente porque tem muito a ver com esta relação de construção com a sociedade. Um ataque que vem como negacionismo, anticonhecimento, antiintelectualismo e que afeta fundamentalmente a vida humana como vem acontecendo durante a pandemia”, disse o professor.
Conhecimento
Virginia Berriel que também é dirigente dos Sindicatos dos Trabalhadores em Telecomunicações e dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro e integrante do movimento Humanos Direitos (MHuD), considerou a articulação das universidades com os movimentos sociais como sendo de extrema importância nesta atual pior fase da história do país, de restrição e de desmonte da classe trabalhadora.
Como exemplo, ela citou a parceria da UFRJ para a constituição do Arquivo de Memória Operária do Rio de Janeiro: “Quem nos dá essa formação são as universidades e os centros da classe operária”, apontou. Virgínia defendeu uma articulação do mundo acadêmico com movimentos sociais para combater a retirada de direitos e o fascismo: “A verdade não é mais verdade, mas o que eles estão escrevendo. E nessa pós-verdade, nada está normal neste momento, e nós precisamos fazer o enfrentamento com conhecimento, com disposição e articulação”.
Arte
O ativista negro e também jornalista, Alessandro Conceição, contou como foi formado o Centro do Teatro do Oprimido (CTO), local de poesia e cultura em geral, e integra o movimento das organizações que preconizam a transformação social através da arte. Pensar os movimentos sociais como produtores de conhecimento para um mundo melhor, assim como ocorre em relação às universidade. Considerou como muito importante.
“A gente acredita que o conhecimento é para todo mundo e uma universidade conectada com o social promove ações sociais”, disse. Alexandro solicitou apoio para que os projetos tocados pelo CTO não acabem, por conta da pandemia. Quem se interessar em colaborar com o Centro deve acessar: https://benfeitoria.com/vivacto
Periferia
Em 2016, o pastor Ariovaldo se uniu a outros pentecostais para fundar a Frente de Evangélicos Pelo Estado de Direito. A Frente, contou, reúne crentes que defendem a justiça, o direito e a democracia e nasceu para fazer contraponto à adesão crítica de dois terços da igreja evangélica ao movimento o golpista que “injustamente tirou da presidência da República Dilma rousseff e também para demarcar oposição à pretensa representatividade reivindicada pela bancada evangélica, que participou ativamente do golpe, e o mais importante, assinalou: realizar um trabalho de conscientização.
“O governo popular ( governos petistas) trouxe a possibilidade da universidade para os povos da periferia, os empobrecidos. Isso foi um movimento revolucionário, principalmente para os evangélicos, que aproveitaram a política de cotas, a criação de mais universidades e escolas públicas. Após o golpe, houve o desmonte do sistema de educação brasileiro, dos sindicatos, da cidadania e da Nação. Para nós, a universidade é um direito e as portas desdsas instituições têm que ser escancaradas para o acesso do povo e para conversar com todos os fóruns de promoção e produção de conteúdo. Por isso a universidade da cidadania nos honra muito”, concluiu o pastor.
MST
Fundador da CUT, Nelson Bernardes explicou que o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) luta Há mais de três décadas pela democratização da propriedade da terra no Brasil, segundo país do mundo em concentração de terra.
Segundo o militante, os movimentos sociais têm travado uma luta intensa contra o latifúndio improdutivo, e diversos setores da universidade garantem o apoio à luta, inclusive jurídico. “A universidade tem papel importante também na formação do pensamento crítico para um país soberano e livre, mas precisa derrubar os muros do saber”, opinou.
“A universidade pega o saber e leva para sua pesquisa, mas isso tem que ser devolvido para a sociedade. Não pode ser distribuído só para alguns apadrinhados”, disse ele, citando como exemplo a pesquisa sobre a agricultura que privilegia o agronegócio e não a agricultura familiar. Na concepção de Nelson, não existe conhecimento ou ciência neutros: “Tem um lado, que pode ser do povo ou do capital. A universidade tem que sair dessa indecisão e apoiar os interesses populares”, afirmou o dirigente.