“Engajados na vida universitária, nós, Professores Eméritos abaixo-assinados, não poderíamos nos calar diante dos recentes cortes de fornecimento de energia e água pelas empresas concessionárias, que tornaram visível a grave crise em que foi lançada a Universidade Federal do Rio de Janeiro, submetida a uma crescente asfixia financeira”, diz trecho do documento assinado por 70 professores eméritos da UFRJ sobre os cortes orçamentários que as universidades federais vêm sofrendo nos últimos anos, conforme informou o representante do segmento no Conselho Universitário Ricardo Medronho.

Veja a íntegra a seguir:

 

NOTA_PÚBLICA_Eméritos_UFRJ_28nov24

 

NOTA PÚBLICA DOS PROFESSORES EMÉRITOS DA UFRJ  À COMUNIDADE UNIVERSITÁRIA E À SOCIEDADE
Engajados na vida universitária, nós, Professores Eméritos abaixo-assinados,
não poderíamos nos calar diante dos recentes cortes de fornecimento de energia e água
pelas empresas concessionárias, que tornaram visível a grave crise em que foi lançada a
Universidade Federal do Rio de Janeiro, submetida a uma crescente asfixia financeira.
Na verdade, esta crise se arrasta há muito anos, desde os governos Temer e
Bolsonaro.

A UFRJ, assim como toda comunidade universitária e científica brasileira,
tinha a expectativa e, até mesmo, a certeza de que o governo eleito em 2022, pelos
compromissos por ele assumidos, disponibilizaria de maneira decidida e urgente os
recursos indispensáveis tanto para saldar dívidas pendentes como para sanar carências
acumuladas por esta universidade no que diz respeito à manutenção de prédios e
laboratórios, à assistência estudantil e tantas outras.

As expectativas se frustraram, e a crise se aguçou. Em 28 de setembro de 2023,
o Conselho Universitário aprovou uma moção, em que apelava para uma suplementação
orçamentária, uma vez que “mantido o atual orçamento proposto na PLOA, a UFRJ
fechará no ano que vem”. (https://consuni.ufrj.br/images/atas/CONSUNI_230928.pdf)
A situação, portanto, já era crítica e de conhecimento não apenas da comunidade
universitária, mas também das autoridades governamentais. Passado um ano, porém,
assistimos consternados ao agravamento de uma crise que esperávamos ver
definitivamente superada. A asfixia orçamentária nos levou a uma dívida com a empresa
concessionária de energia elétrica de R$ 31,8 milhões, decorrente de faturas não pagas
em 2024, além de R$ 3,9 milhões em parcelas não quitadas de um acordo firmado em
2020.

A isso somam-se as dívidas com a concessionária do serviço de abastecimento de
água e com várias empresas contratadas para prestação de diferentes serviços. A
degradação de nossas instalações é visível, a exemplo da Escola de Educação Física e
Desportos, cujas aulas tiveram que ser deslocadas após o desabamento de um muro,
sinalizando gravemente vários outros riscos ainda não sanados.
Diante da emergência decorrente do corte de fornecimento de energia, o
Ministério da Educação veio a público, demonstrando, no entanto, sua insensibilidade ou
sua total incompreensão em relação ao que efetivamente se passa.

Após culpar os governos anteriores, omitindo que o orçamento de 2024, diferentemente do de 2023, foi
elaborado pelo governo atual, insinua que as dificuldades não seriam decorrentes da falta
de recursos, mas, sim, de problemas de gestão interna: “A gestão orçamentária e
financeira das universidades federais é pautada pela autonomia garantida pelo artigo
207 da Constituição Federal. Assim, as instituições têm total liberdade para definir suas
prioridades internas, incluindo a alocação de recursos, a gestão de contratos
terceirizados e a execução de projetos, conforme suas necessidades e diretrizes
institucionais.”
(https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2024/11/12/ufrj-tem
corte-de-energia-eletrica-por-inadimplencia-diz-light.ghtml).

Lamentavelmente, repete-se a mesma tentativa do governo anterior de imputar à
“má gestão interna” os problemas que enfrentamos. Caberia perguntar: com os parcos
recursos disponíveis, quais seriam as prioridades? Pagar o fornecimento de eletricidade
ou as bolsas dos estudantes pobres? Pagar o fornecimento de água ou a alimentação
estudantil? Assegurar serviços de segurança ou de limpeza?

No momento em que o cumprimento do teto de gastos, imposto pelo
eufemisticamente chamado “arcabouço fiscal”, é exigido pela grande imprensa
corporativa e são anunciados novos cortes nas despesas e investimentos nas áreas de
saúde, educação e direitos trabalhistas, a crise da UFRJ apenas denuncia a
irresponsabilidade daqueles que pretendem impor à nação a continuidade de políticas que
corroem nosso Estado e nossas instituições públicas, as universidades entre elas.
Sabemos que não faltam recursos ao Tesouro para atender às necessidades
básicas, à educação, à saúde, à cultura, à manutenção de um meio ambiente equilibrado,
à assistência social e a outros direitos sociais garantidos pela constituição e pela legislação
vigente.

Afinal, cerca de R$ 600 bilhões são dedicados anualmente a pagar uma dívida
pública constituída, em grande parte, de juros acumulados. Isso para não falar dos
orçamentos secretos ou dos R$ 647 bilhões (5,96% do PIB) distribuídos com
generosidade, em 2023, sob a forma de subsídios (https://www.gov.br/planejamento/pt
br/assuntos/noticias/2024/julho/apos-dois-anos-de-significativa-expansao-subsidios
concedidos-pela-uniao-apresentam-estabilidade-em-2023).

Por essas razões, nós, Professores Eméritos da UFRJ, juntamo-nos às vozes e
lutas de nossa comunidade universitária e de todos aqueles que sabem que as
universidades públicas, gratuitas, de qualidade e comprometidas com as necessidades do
povo brasileiro constituem fundamento essencial de qualquer projeto nacional digno deste
nome. Reivindicamos, com firmeza, que o governo cumpra os compromissos assumidos
com a educação, a ciência, a cultura e com a produção e a reprodução do conhecimento,
convocando associações científicas, colegas de outras universidades, assim como toda a
sociedade, para defender a integridade da universidade pública, como garantia do
presente e do futuro do Brasil.

Rio de Janeiro, 28 de novembro de 2024

 

Adalberto Ramon Vieyra
Adelaide Maria de Souza Antunes
Ana Ivenicki
Ana Maria Ferreira da Costa Monteiro
Antonio Carlos Campos de Carvalho
Antonio Carlos Secchin
Antonio Giannella-Neto
Beatriz Becker
Carlos Aguiar de Medeiros
Carlos Bernardo Vainer
Carmen Lucia Tindó Secco
Celina Maria Moreira de Mello
Consuelo da Luz Lins
Dinah Maria Isensee Callou
Djalma Mosqueira Falcão
Edson dos Santos Marchiori
Eduardo de Faria Coutinho
Elba Pinto da Silva
Erasmo Madureira Ferreira
Fernando Garcia de Mello
Francisco Radler de Aquino Neto
Gilberto Barbosa Domont
Hatsaburo Masuda
Helio dos Santos Migon
Henrique Murad
Hilton Augusto Koch
Jorge Almeida Guimarães
Jorge Fernandes da Silveira
José Egídio Paulo de Oliveira
José Luis da Costa Fiori
José Mauro Peralta
José Paulo Netto
José Roberto Lapa e Silva
José Sergio Leite Lopes
Liu Hsu
Luiz Antônio Constant Rodrigues da Cunha
Luiz Bevilacqua
Luiz Felipe Alvahydo de Ulhoa Canto
Manuel Domingos da Cruz Gonçalves
Marcello André Barcinski
Márcio Tavares d’Amaral
Marcos Roberto da Silva Borges
Maria Angela Dias
Maria Antonieta Rubio Tyrrell
Maria Aparecida Lino Pauliukonis
Marieta de Moraes Ferreira
Marlene Soares dos Santos
Muniz Sodré de Araújo Cabral
Nei Pereira Junior
Nelson Francisco Favilla Ebecken
Nelson Maculan Filho
Nelson Velho de Castro Faria
Nubia Verçosa Figueiredo
Olaf Malm
Otávio Guilherme Cardoso Alves Velho
Paulo Alcantara Gomes
Paulo Mascarello Bisch
Raquel Paiva de Araújo Soares
Ricardo de Andrade Medronho
Rudolph Trouw
Sandoval Carneiro Jr.
Segen Farid Estefen
Sonia Gomes Pereira
Takeshi Kodama
Talita Romero Franco
Teresa Cristina Cerdeira da Silva
Vera Lúcia Rabello de Castro Halfoun
Volney de Magalhães Câmara
Willy Alvarenga Lacerda
Yvone Maggie de Leers Costa Ribeiro