Em tempos de fascismo, ataque a democracia e tentativa de golpe o movimento sindical e social tem feito ações para relembrar o que foi a ditadura que mergulhou o país durante 20 anos no arbítrio. Esse ano de 2024, ações de rua e atos simbólicos permearam os mesespara defender a democracia e marcar os 60 anos da ditadura que cometeu diversas atrocidades contra homens, mulheres e jovens, do campo e da cidade.
Particularmente na UFRJ que sofreu intervenções e enfrentou um grande esvaziamento de seu quadro docente e a expulsão de muitos estudantes, suas vítimas foram lembradas e homenageadas. Agora, encerrando o ano, foi inaugurado memorial em frente ao Restaurante Universitário Central, um totem criado por equipe da Escola de Belas Artes, em homenagem a 23 estudantes e dois jovens professores da UFRJ mortos e desaparecidos durante a ditadura.
O nome do RU Central homenageia o estudante secundarista Edson Luís Lima Souto, morto por policiais militares, no dia 28 de março de 1968, durante a preparação de um ato contra as condições precárias do restaurante Calabouço, que servia refeições a preços populares para alunos da rede pública.
Na cerimônia do memorial em que foi descerrado o totem colocado em frente ao RU Central, nesta quinta-feira, 19, o reitor Roberto Medronho leu ao fim do evento o nome de cada uma das vítimas comprovadas oficialmente na UFRJ, emocionando familiares, estudantes, técnico-administrativos, professores, e integrantes da comunidade universitária presentes e outros mais que vivenciaram os horrores da ditadura. Histórias e episódios envolvendo as vítimas e seus familiares e amigos foram rememoradas pelos participantes.
O reitor fez referência também ao professor Helio de Mattos Alves, chefe de gabinete, responsável pela organização dos eventos Memória, Verdade, Justiça e Reparação da UFRJ realizados esse ano.O coordenador da comissão Memória e Verdade da UFRJ, José Sérgio Leite Lopes, destacou a relevância história e política das ações para elucidar o regime e as vítimas que produziu. “Nossos colegas partiram, mas deixaram um legado. O importante é que essa luta está sendo desenvolvida pelas gerações seguintes.Essa temática da memória, verdade, justiça e reparação embora não seja permanente no Brasil infelizmente, mas vai se conquistado aos poucos necessárias reparações.”
A jornalista Hildegard Angel, filha da estilista Zuzu Angel e irmã do estudante de economia da UFRJ Stuart Angel Jones, um dos desaparecidos da ditadura, deu um depoimento emocionado sobre Stuart, relatou as atrocidades da ditadura, falou sobre a luta de Zuzu para encontrar Stuart, denunciouque um totem colocado em sua homenagem no Clube Flamengo (era um dos seus remadores) foi demolido pela então presidente bolsonarista do clube alertando sobre a ameaça bolsonarista, e chamou para a frente os colegas que viveram o arbítrio como Vitoria Grabois, Sonia Morais, Jessie Jane e Roberto Molina.
“Era uma luta desigual. Desnecessária. Eles demonizavam, falavam de terroristas quando na realidade eles faziam o terrorismo jogando bombas e cometendo atrocidades. Transformaram os jovens que estavam ali se expondo em inimigos do povo e os jovens estavam ali exatamente pelo grande amor que sentiam pelo povo brasileiro”, lembrou Hildegard.
A jornalista chamou a atenção para a ameaça fascista do bolsonarismo que comunga com o regime autoritário da ditadura.
“O totem no Flamengo foi demolido pela então presidente bolsonarista. Assim como a estrela de três pontas que havia dos campeões do clube na entrada do Flamengo, porque não podiam só arrancar a estrela do Stuart. Então quando eles vêm, vêm com uma política de terra arrasada. Eles não permitem espaço para pensamento, sentimento, cultura, ciência, educação. Para nada! Eles querem tudo. Cargos, soldos, tudo. E eles querem a morte de todos os diferentes, de todos que não pensam como eles. Que as novas gerações se conscientizem do risco que estão correndo”, alertou Hildegard.
O coordenador-geral do Sintufrj, Esteban Crescente, falou sobre a importância de atos que lembrem esse passado, suas vítimas e sua luta para que se possa defender o presente e almejar um futuro menos desigual:
“Não é apenas olhar para o passado. Trata-se de marcar posição no momento presente para enfrentar os possíveis futuros e apontar o que almejamos para o conjunto dos trabalhadores e para a juventude. Tivemos uma conspiração para assassinar o presidente da república e um ministro do STF e um dispositivo militar sendo preparado para tomada de poder e instauração de um regime de exceção que silenciaria sindicatos, movimento estudantil e sem dúvida nenhuma ia intervir dentro das universidades. O que aconteceu e o que hora debatemos na sociedade nesse momento tem total relação com o sacrifício desses companheiros e dessas companheiras nominados nesse monumento. Eles tombaram no enfrentamento à ditadura militar. Inclusive é simbólico porque o primeiro a ser assassinado aqui no Rio foi o Edson Luiz, que lutava por assistência estudantil na frente de um restaurante universitário. Hoje estamos aqui podendo ter um bandejão porque derrotamos uma ditadura para poder lutar por orçamento, por expansão da universidade e direito a acesso e permanência. Todas essas coisas estão relacionadas e temos de dizer isso para a comunidade acadêmica e para a sociedade”, declarou o coordenador-geral do Sintufrj, Esteban Crescente.