Embora portaria flexibilize condições, Sintufrj recomenda atenção para evitar riscos à vida e à autonomia universitária
O MEC não revogou a portaria que determinava a retomada das aulas presenciais nas instituições de educação superior do sistema federal de ensino. O que fez foi editar outra alterando a data do retorno às atividades acadêmicas presenciais de 4 de janeiro para 1º de março. O recuo foi resultado da enxurrada de críticas de reitores das universidades federais.
O ministro da Educação chegou a anunciar a suspensão da Portaria nº 1.030, de 1º de dezembro, e a se reunir com representantes das instituições federais de ensino superior (Ifes) e de entidades, no dia 4. Mas, na segunda-feira, 7, o MEC divulgou uma nova Portaria, a de nº 1.038, contrariando a maioria dos presentes na reunião, que defendeu a homologação da Resolução do Conselho Nacional de Educação garantindo o ensino remoto até dezembro de 2021.
Novidade
A segunda portaria permite que as instituições usem recursos digitais de forma integral em alguns casos, por exemplo, se forem suspensas as atividades letivas presenciais por determinação das autoridades locais ou devido a condições sanitárias que tragam riscos à segurança dos participantes. Tais recursos também podem ser usados em caráter excepcional para integralizar a carga horária das atividades pedagógicas “no cumprimento das medidas para enfrentamento da pandemia de Covid-19 estabelecidas em protocolos de biossegurança”.
Sintufrj: “É preciso ficar atento”
“Embora ainda seja um engessamento, a mudança possibilita que a universidade faça uso de sua autonomia não retomando em 1º de março todas as atividades acadêmicas presenciais se os especialistas indicarem riscos de contaminação pela Covid-19. A nova portaria, portanto, flexibiliza um pouco a decisão adotada pelo MEC de impor a volta às aulas presenciais nas Ifes. Mas precisamos ficar atentos para não permitir que a nossa autonomia e a vida de toda comunidade universitária seja colocada em risco”, avaliou a coordenadora do Sintufrj, Joana de Angelis.
O que cabe à UFRJ
“Vamos ter que responder ao MEC, porque a Portaria 1.038 pede que as instituições comuniquem caso utilizem-se de recursos digitais, mas, antes, temos que responder ao Ministério Público, que enviou, no dia 7, recomendações à UFRJ para que apresentasse um plano de ação para a retomada do ensino presencial e, junto, um cronograma de aulas para iniciar em 60 dias”, informou o vice-reitor da UFRJ, Carlos Frederico Leão Rocha.
A resposta ao MP a UFRJ pretende enviar nos próximos 15 dias e, segundo o vice-reitor, o documento já está preparando com as estratégias que a universidade já vem adotando. “A UFRJ não ficou parada”, destacou ele.
Covidímetro indica cautela
De acordo com Rocha, “a UFRJ tem razões suficientes para postergar um eventual início de aula presencial, seja sob ponto de vista do estágio da pandemia, seja do ponto de vista das instalações físicas da universidade”. Mas afirmou que o retorno “paulatinamente já estava sendo planejado, principalmente das atividades de laboratórios e das aulas práticas, que são necessárias para a conclusão de cursos e que, neste momento, a formatura de estudante pode se constituir em importante fonte de renda para a família”.
Ele acredita que a UFRJ conseguirá manter as diretrizes gerais que vem sendo planejadas pela Reitoria e pelos grupos de trabalho (GTs formados por especialistas que discutem medidas de enfrentamento à Covid-19 e de preparação para o período pós-pandemia). “Portanto”, disse, “a instituição seguirá as orientações adotadas até aqui, até porque os indicadores da pandemia continuam altos, como a taxa “R” (indicador de reprodutibilidade do vírus), conforme consta no Covidímetro (ferramenta criada por pesquisadores da UFRJ que alerta sobre o potencial de transmissão)”.
“Qual será o fator “R” no dia 1º de março e qual será o “R” da cidade do Rio de Janeiro? Eu não sei. Achávamos que agora estaríamos nos aproximando de 1 (risco moderado), mas agora a cidade está em 1,4 (risco alto)” – dados do boletim no dia 3 de dezembro”. Segundo o vice-reitor, o calendário do primeiro período de 2020 (que começou no dia 30 de novembro e segue até o início de março) continuará remoto.
Cada instituição ajustará seu calendário
“A portaria nº 1.038 traz, sim, alguma flexibilidade, mas é importante ressaltar que as universidades federais brasileiras estão em plena atividade, seguindo um calendário de planejamento aprovado pelos seus conselhos superiores”, disse o presidente da Associação dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Edward Madureira.
“As universidades têm atividades para além do ensino de graduação e pós-graduação, pesquisa, extensão e assistência, que estão acontecendo normalmente e com protocolos de segurança”, garantiu.
Segundo o dirigente, o retorno das atividades presenciais será definido a partir das condições epidemiológicas de cada localidade: “Desta forma, como a portaria não obriga esse retorno presencial, cada universidade ajustará seu calendário de acordo com estas condições”.
“Algumas atividades presencias já acontecem com todo protocolo de biossegurança e esse planejamento é baseado principalmente na segurança das pessoas, na qualidade daquilo que é oferecido e também na isonomia de tratamento de todos os estudantes”, informou, acrescentando que as Ifes têm autonomia para decidirem sobre o calendário acadêmico.
A despeito da nova portaria do MEC, as universidades federais, no uso de sua autonomia, garantem que seguirão com seus cronogramas para retomada gradual das atividades acadêmicas presenciais, conforme já definiram, principalmente no momento atual em que a Covid-19 entre numa fase perigosa. Os sindicatos de trabalhadores das instituições rechaçam a decisão do governo.
Após a edição da nova portaria do MEC determinando a volta das atividades acadêmicas presenciais em 1º de março, a Universidade Federal Fluminense (UFF) ratificou seu comunicado enviado à comunidade universitária no dia 2 de dezembro. “A retomada das atividades presenciais irrestritas não possui data marcada com antecedência, tendo em vista as condições atuais da pandemia de Covid-19 no estado do Rio de Janeiro. A UFF continuará seguindo o conhecimento científico e a responsabilidade institucional para planejar o calendário acadêmico e as metodologias das atividades de ensino-aprendizagem”, diz o texto.
A coordenadora-geral do Sintuff, Bernarda Gomes, sustenta que o retorno presencial só deve ocorrer quando a vacina chegar no país. “Não dá para pensar o retorno das aulas com a realidade que estamos vivendo. Aqui a pandemia é crescente e não houve medidas para contê-la, como, por exemplo, um novo lockdow ou para freá-la com a permanência em casa por determinados períodos. Por isso não há como indicar retorno sem a vacina”, afirma.
Irresponsabilidade
“Nosso posicionamento sempre foi em defesa da vida. Então, enquanto não houver vacina para todos não tem como colocar alunos dentro da universidade e trabalhadores além dos que já estão, nos serviços essenciais. Caso contrário seria uma irresponsabilidade com a pandemia aumentando, principalmente no Rio de Janeiro, e com falta de leitos. É colocar a vida das pessoas em risco”, disse a coordenadora-geral do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (Sintur-RJ), Ivanilda Reis.
Segundo ainda a dirigente, o retorno presencial exige que a universidade se reestruture para garantir a higiene básica dos espaços e de equipamentos. “Não é um retorno simplesmente. Temos que verificar a infraestrutura da universidade. Limpar. Na Rural, por exemplo, estamos sem empresa de limpeza. Então seria inviável colocar pessoas dentro da universidade se nem limpeza, que é o principal fator de defesa da Covi-19, está garantido. A vida de alunos, técnicos-administrativos e professores tem de estar 100% garantida. Hoje não tem a menor condição sem estarem todos vacinados. Por isso somos contra. Nossas vidas importam. Esse é o nosso lema”, defende Ivanilda. “Trabalhar sim, morrer não” é o lema do Sintur-RJ, informa a sindicalista.
Em nota, a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro afirma que continuará o processo de avaliação dos Estudos Continuados Emergenciais (ECEs) e do planejamento, visando a oferta dos três períodos letivos previstos para o ano de 2021, conforme aprovado nos Conselhos Superiores.
Federais gaúchas só voltarão com segurança
Os reitores das universidades federais gaúchas, lançando mão da autonomia universitária, defendem a retomada presencial apenas quando houver controle da pandemia.
A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), internamente, já optou pela continuidade do Ensino Remoto Emergencial (Ere) para o próximo semestre do ano que vem, que começa em 25 de janeiro e vai até 28 de maio.
“Se o nível de contágio na Capital permanecer alto em março, vamos comunicar a renovação do Ere ao MEC. Se for preciso, ficaremos no sistema não presencial, que é o já previsto pela UFRGS, porque priorizamos a saúde de toda nossa comunidade acadêmica. Caso as autoridades sanitárias locais avaliem, no futuro, um abrandamento do quadro (da Covid-19), daremos os primeiros passos em direção às aulas presenciais, de forma restrita e gradual, afirma a reitora em exercício, Patricia Pranke.
A Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), informa que uma possível retomada será avaliada em março, tendo como base o quadro pandêmico de Porto Alegre, visando a preservação da comunidade acadêmica, mas também da comunidade externa. Isso porque os professores da universidade atuam no atendimento de pacientes positivados para a doença.
“A portaria é clara ao falar sobre a necessidade de termos boas condições sanitárias e vamos nos basear nisto. Se houver risco de segurança à vida dos nossos alunos, professores e funcionários, optaremos pelo trabalho remoto para preservar vidas. E, em nosso caso específico, tem um detalhe importante: Nossos docentes atuam na linha de frente (no combate ao coronavírus), eles já estão esgotados. Com a retomada das aulas presenciais, em um cenário grave de contágio pelo coronavírus no Estado, eles teriam uma carga de trabalho ainda maior. Porque implicaria dar a mesma aula, talvez, para cinco turmas diferentes, já que temos uma lotação máxima das salas”, declara a reitora Lucia Pellanda.
Na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) o reitor Pedro Hallal diz que a instituição é quem definirá quando voltará para a sala de aula. Ele reforçou que a UFPel tem sido uma grande protagonista no enfrentamento do coronavírus e seguirá desempenhando esse papel nos próximos meses.
“A UFPel está trabalhando mais do que nunca durante a pandemia. Sobre as aulas presenciais, com base no princípio constitucional da autonomia universitária, a decisão sobre a data do retorno é da UFPel e não do MEC (Ministério da Educação). Seguiremos trabalhando com responsabilidade para garantir o retorno seguro no momento adequado, sempre acompanhando o estágio da pandemia”, garante.
A reitora da Universidade Federal de Rio Grande (FURG), Cleuza Dias, demonstrou preocupação com o anúncio da retomada das aulas presenciais em março. Segundo ela, a universidade irá analisar melhor a portaria e buscará soluções para, de forma autônoma, decidir o melhor momento para a retomada das aulas em Rio Grande. A dirigente considerou a data precipitada.
“Sempre nos preocupa estas decisões sem discutir detalhadamente. Vamos analisar a autonomia da universidade e levar em conta a situação no Sul do Estado. Na minha avaliação, é muito precipitado este anúncio. Ainda não temos um panorama de como estaremos nem em janeiro”.
O reitor da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), Roberlaine Jorge, explica que muitas das 10 cidades onde a instituição tem sede são de fronteira ou base de quarteis – o que eleva o risco de circulação do vírus. Em março a universidade irá avaliar o quadro da epidemia e afirma que se acontecer, o retorno será gradual.
“Voltaremos às aulas em 2 de fevereiro de 2021 no sistema remoto. Em março, vamos avaliar o quadro das cidades e região. Entretanto, não acredito em uma retomada massiva das aulas presenciais. Caso ela aconteça, será de maneira gradual, começando por alguns laboratórios, por exemplo. O comportamento do coronavírus é muito instável para determinarmos com 100% de certeza uma retomada dos encontros presenciais para as universidades”.
Há exatos mil dias, a vereadora Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes, foram brutalmente assassinados no Rio de Janeiro e, até hoje, não há respostas sobre quem foi o autor intelectual do crime investigado pela Polícia Civil e pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ).
Ao longo desses quase três anos, o inquérito aponta a participação de milicianos das forças de segurança.
Já políticos do Rio de Janeiro figuram como suspeitos da autoria intelectual do crime e ao menos três deles foram considerados suspeitos de planejar a execução: o vereador Marcelo Siciliano (PHS), o ex-vereador Cristiano Girão e o ex-deputado Domingos Brazão, conselheiro afastado do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Todos negam envolvimento.
A suspeita sobre Brazão se intensificou em setembro de 2019, quando Raquel Dodge, em seu último ato à frente da Procuradoria Geral da República (PGR), apresentou uma denúncia ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) apontando-o como responsável pelo crime.
Poucos meses antes, em junho, Brazão virou réu em ação penal após a Operação “Quinto do Ouro“, uma desdobramento da Lava Jato que apura fraudes no TCE. Ele chegou a ser preso em 2017 mas foi solto e segue afastado da função.
Na mesma ocasião, Dodge indicou a federalização do caso, mudança negada em maio deste ano pelo STJ.
A decisão foi em consonância com a vontade da família de Marielle, que, apesar de defender a federalização em um primeiro momento, mudou de ideia após a eleição de Jair Bolsonaro.
Em 14 de março de 2019, o policial reformado Ronnie Lessa e o ex-policial militar Élcio Queiroz foram presos acusados de serem os executores do crime. Eles irão a júri popular.
A motivação do crime ainda não é clara, mas segundo denúncia do MP contra os milicianos, Marielle foi morta em razão de sua militância em favor dos direitos humanos.
Obstruções
A federalização sugerida pela ex-PGR foi impulsionada após um inquérito aberto pelo órgão para apurar obstruções no processo de investigação também em setembro de 2019.
Os policiais federais Hélio Khristian de Almeida e Gilberto da Costa, o PM Rodrigo Jorge Ferreira, a advogada Camila Nogueira, e, novamente, Domingos Brazão, foram denunciados por Dodge.
Eles teriam atuado para prejudicar o vereador Marcelo Siciliano e o miliciano Orlando da Curicica, além de plantarem uma testemunha com o objetivo de desviar o foco das investigações da Polícia Civil sobre os mandantes do assassinato.
O caso estava sob relatoria do ministro Raul Araújo, que encaminhou processo em julho deste ano para o Tribunal de Justiça do Rio realizar o julgamento. O processo corre em sigilo.
Um mês antes, o bombeiro Maxwell Simões Correa também havia sido preso no Rio de Janeiro sob a acusação de obstruir as investigações relacionadas à execução de Marielle Franco e Anderson Gomes.
Ele foi proprietário do carro utilizado para ocultar armas de Ronnie Lessa que, após o crime, foram lançadas ao mar.
Em nota divulgada na marca de dois anos dos assassinatos, completados em março deste ano, a Promotoria afirmou ter coletado depoimentos de mais de 200 testemunhas, cumprido medidas cautelares, buscas e apreensões, além de ter realizado perícias.
Desde a execução, a investigação do caso trocou de chefia duas vezes. Em setembro deste ano, Moisés Santana assumiu a Delegacia de Homicídios da capital carioca e se tornou o responsável pelo caso.
Ele substituiu Daniel Rosa, que já havia ocupado o posto do delegado Giniton Lages, que era titular quando o crime ocorreu. A substituição ocorreu logo após a detenção de Lessa e Queiroz.
Bolsonaro e a milícia
A relação do presidente com milicianos no Rio de Janeiro se explicitou desde as primeiras informações e prisões do caso. A começar pela prisão de Lessa, que era vizinho de Bolsonaro no condomínio Vivendas da Barra, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro.
Em reportagem especial publicada nos dois anos do assassinato de Marielle, o Brasil de Fato detalhou os passos da investigação e a proximidade de Bolsonaro com os envolvidos.
Confira os principais trechos:
O mandante
Os investigadores se aproximaram de Domingos Brazão após interceptações feitas pela Polícia Federal no telefone do miliciano Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba.
Em diálogo com o vereador Marcello Siciliano (PHS), que ocorreu em 8 de fevereiro de 2019, divulgado pelo UOL, o miliciano afirma que Brazão é o mandante do crime e que teria pago R$ 500 mil pela execução da vereadora.
“Só que o sr. Brazão veio aqui fazer um pedido para um dos nossos aqui, que fez contato com o pessoal do Escritório do Crime, fora do Adriano [da Nóbrega], sem consentimento do Adriano. Os moleques foram lá, montaram uma cabrazinha, fizeram o trabalho de casa, tudo bonitinho, ba-ba-ba, escoltaram, esperaram, papa-pa, pa-pa-pa pum. Foram lá e tacaram fogo nela [Marielle]”, afirma Beto Bomba, na conversa com Siciliano.
Empresário da construção civil e cumprindo seu primeiro mandato na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, Marcello Siciliano se elegeu em 2016, com votação expressiva na zona oeste do município, em regiões controladas pelas milícias, como Rio das Pedras.
Em dezembro de 2018, a Câmara Municipal aprovou um projeto de Marcello Siciliano, em parceria com os vereadores Felipe Michel (PSDB) e Inaldo Silva (PRB), que autorizava a Igreja Batista Atitude, na Barra da Tijuca, a construir uma templo novo e maior, que já foi inaugurado.
A igreja é frequentada por Michelle Bolsonaro e Jair Bolsonaro, que receberam, inclusive, uma festa de despedida dos fieis quando foram morar em Brasília.
Em relatório da Polícia Federal, o miliciano Rodrigo Jorge Ferreira, o Ferreirinha, que também foi interceptado pela PF, fala sobre a disputa eleitoral na região da Barra da Tijuca como uma possível motivação de Brazão para matar Marielle Franco.
“A mesma análise dá conta de outra disputa territorial: observou-se proximidade entre as zonas eleitorais onde Marielle Franco e Chiquinho Brazão [irmão mais velho de Domingos] obtiveram a maioria de votos”, aponta o relatório. Ainda de acordo com o documento, o conselheiro do TCE é próximo dos milicianos.
Chiquinho Brazão, hoje deputado federal pelo Avante, que é sócio do irmão em uma rede de postos de gasolina, recebeu do governo de Jair Bolsonaro três passaportes diplomáticos, em março de 2019.
De acordo com as revelações feitas pelo Brasil de Fato, o benefício foi concedido ao parlamentar, à Dalila Maria de Moraes Brazão, sua esposa, e a João Vitor de Moraes Brazão, seu filho.
Em outro trecho do texto, o delegado da PF Leandro Almada, que assina o relatório, não hesita em apontar o conselheiro do TCE como responsável pela execução.
Em interceptação telefônica feita pela PF, o miliciano Beto Bomba aponta outros executores para o assassinato de Marielle: Edmilson Gomes Menezes, o Macaquinho, Leonardo Gouveia da Silva, o Mad, e Leonardo Luccas Pereira, o Leléo. O major da Polícia Militar Ronald Alves Pereira teria comandado a operação.
Ronnie Lessa e Élcio Queiroz foram presos no Rio de Janeiro um mês após as conversas.
Escritório do Crime e Bolsonaro
Ronnie Lessa, Élcio Queiroz, Mad, Leléo e Macaquinho estão no catálogo de matadores de aluguel do Escritório do Crime, grupo de agentes das forças de segurança que atuam na região de Rio das Pedras, zona oeste do Rio de Janeiro, há pelo menos 20 anos.
Citado por Beto Bomba, Adriano Magalhães da Nóbrega, ex-oficial do Bope, é apontado como chefe da organização criminosa.
Assassinado no dia 9 de fevereiro deste ano, após uma operação policial que tentava capturá-lo na Bahia, depois de um ano foragido, Adriano da Nóbrega é figura-chave para compreender diversos crimes, mas também para entender a relação do clã Bolsonaro com as milícias cariocas.
O advogado do ex-agente do Bope, Paulo Emílio Catta Preta, que também é advogado de Fabrício Queiroz, em entrevista ao Globo, levantou a possibilidade de que seu cliente tenha morrido por saber demais. Porém, não especificou os segredos de Nóbrega.
“Ele me disse assim: ‘doutor, ninguém está aqui para me prender. Eles querem me matar. Se me prenderem, vão matar na prisão. Tenho certeza que vão me matar por queima de arquivo’. Palavras dele”, afirmou o defensor.
FERNANDO BERTOLO/BRASIL DE FATO
Com Adriano, foram apreendidos 13 celulares, que estão com a Polícia Civil do Rio de Janeiro e já foram periciados, como informou o Brasil de Fato em julho deste ano.
Nóbrega já havia sido citado no noticiário, pois é apontado pelo MPRJ como beneficiário do esquema de “rachadinha” no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, filho de Jair Bolsonaro, que hoje é senador da República.
É chamado de “rachadinha” um esquema que ocorre quando, por exemplo, funcionários do gabinete de um parlamentar repassam parte de seus salários para o político.
O Ministério Público usou informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para indicar que Fabrício Queiroz, enquanto era assessor no gabinete de Flávio Bolsonaro, teria recebido R$ 2 milhões em sua conta, divididos em 483 depósitos.
No mesmo mandato na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), trabalharam a ex-esposa e a mãe de Nóbrega, Danielle Mendonça da Costa e Raimunda Veras Magalhães, respectivamente.
Ambas receberam um total de R$ 1.029.042,48 em salários e repassaram R$ 203 mil para Fabrício Queiroz, respeitando o esquema estabelecido no gabinete para beneficiar o parlamentar, de acordo com a denúncia do MPE.
Ao todo, Queiroz movimentou R$ 7 milhões em três anos. Entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, o ex-assessor de Flávio Bolsonaro fez diversos depósitos e saques que somam R$ 1,2 milhão. Um dos depósitos, de R$ 24 mil, foi feito na conta da primeira dama Michelle Bolsonaro, no ano de 2016.
Questionado sobre o repasse à sua esposa, Jair Bolsonaro informou que fez um empréstimo a Queiroz e o depósito seria parte do pagamento. O presidente lembrou, em entrevista, que é amigo do ex-assessor do filho desde 1984.
A amizade também é a natureza da relação entre Adriano da Nóbrega e Queiroz, que se conhecem desde 2003, quando serviram juntos no 18º Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro (PMRJ). Justamente neste, Nóbrega recebeu a primeira homenagem de Flávio Bolsonaro na Alerj.
A segunda viria em 2005, ano em que o ex-agente do Bope foi julgado e condenado por um júri popular, por conta de um homicídio. O miliciano não compareceu à premiação por estar preso.
Durante o seu julgamento, Nóbrega recebeu um apoio importante, do então deputado federal Jair Bolsonaro. Após a audiência que culminou na condenação do miliciano, o atual presidente da República foi até a tribuna da Câmara dos Deputados e defendeu o militar. “Ele sempre foi um brilhante oficial”.
Em 2007, Nóbrega recorreu da decisão e foi inocentado. Em 2013, foi expulso da PM, por conta de seu envolvimento com o jogo do bicho.
Outro importante personagem do chamado “Escritório do Crime”, o major Ronald Paulo Alves, apontado por Beto Bomba como responsável por organizar o grupo de assassinos que executariam Marielle Franco e Anderson Gomes, também foi homenageado por Flávio Bolsonaro na Alerj.
Em 2004, o filho do presidente celebrou uma ação comandada por Alves que terminou com três mortes. Um ano antes, em 2003, o major teria participado da chacina de cinco jovens dentro da da boate Via Show, em São João de Meriti.
Quatro policiais já foram condenados pelo caso e somente o agente condecorado por Flávio Bolsonaro ainda não foi julgado.
No último dia 15 de fevereiro, após a morte de Nóbrega, Bolsonaro foi interpelado sobre sua relação com milicianos e negou qualquer vínculo. “Eu não conheço a milícia no Rio de Janeiro. Desconheço. Não existe nenhuma ligação minha com a milícia do Rio de Janeiro”, afirmou.
Acusado de roubo, Alex Júnior Alves de Souza foi agredido por seguranças no supermercado Guaicuí, na cidade de Várzea da Palma; cliente tentou filmar a agressão e foi impedida por funcionário e imagens de câmera de segurança mostram que jovem não roubou nada; assista
Menos de um mês após o brutal assassinato de João Alberto, homem negro espancado até a morte por seguranças de um Carrefour em Porto Alegre (RS), outro caso de agressão em supermercado supostamente motivada por racismo ocorreu neste final de semana na cidade de Várzea da Palma, no Norte de Minas Gerais.
Alex Júnior Alves de Souza, de 28 anos, contou em depoimento à polícia, ainda na unidade de saúde em que foi atendido após o espancamento, que foi acusado de roubar uma botina por um segurança do supermercado Guaicuí. O dono do mercado, então, identificado como Rubens, teria aparecido armado e o arrastado, junto com outros seguranças, para uma sala do estabelecimento. No local, teria ocorrido a agressão.
“Me pegou, deu porrada na boca do estômago, na boca, enquanto eu estava no chão, os dois me chutaram. O pessoal que estava dentro lá na hora, o pessoal ouviu eu falando que eu não estava errado e que eu ia provar que estava certo”, relatou o jovem em vídeo que circula nas redes sociais.
Alex comprou a botina pela qual foi acusado de roubo em um outro supermercado da região, conforme mostram câmeras de segurança do estabelecimento. No Guaicuí, o jovem experimentou uma sandália e queria comprar uma peça de frango para o almoço.
“Estou aqui no pronto socorro me recuperando das lesões causadas devido ao tratamento com racismo que puseram a minha pessoa. Me chamando de negro ladrão… Me arrastaram e fizeram isso comigo. Espero que não fique sequela nenhuma, porque apesar de não parecer a situação tá um pouco crítica”, disse Alex em vídeo gravado em uma cama no hospital. Ele ficou com uma lesão no olho e diversos hematomas pelo corpo.
No momento em que o jovem era arrastado por seguranças para ser agredido, uma cliente do supermercado tentou filmar a cena e foi impedida por funcionários. “Hoje em dia tem que filmar tudo, matam a pessoa fácil, fácil.. Você não pode fazer isso, matou o cara do Carrefour desse jeito”, afirmava a mulher na gravação, antes de ser interrompida.
Em grupos de Facebook, moradores da cidade marcam um protesto contra o supermercado Guacuí, em frente ao estabelecimento, para o próximo sábado (12).
Fórum tentou contato com o supermercado mas não obteve retorno até a publicação desta matéria.