Desde 2019 o ponto eletrônico é uma realidade para os técnicos-administrativos da Universidade Federal Fluminense (UFF), por força de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal, que pôs fim ao acordo assinado entre a Reitoria e o Sintuff, no fim de 2016, após uma greve pelas 30 horas para toda a categoria. Os docentes ficaram de fora.
Segundo a coordenadora-geral do Sintuff Bernarda Gomes, “o ponto biométrico na UFF foi colocado com a justificativa de que a universidade perdera um processo judicial, no qual o juiz dizia que deveria ser colocado o ponto eletrônico, mas não especificava o modelo a ser adotado”.
Problemas aumentaram
A dirigente do Sintuff disse que o ponto eletrônico aumentou a burocracia na universidade. “Da forma como foi colocado, criou muito mais serviço para a chefia, porque quase tudo ela tem que autorizar. Se cheguei atrasada, minha compensação minha chefia tem que autorizar, e tenho que compensar em um período determinado, pois se eu não compensar naquele período de forma registrada, tenho desconto no meu contracheque”.
O custo do ponto eletrônico é alto, garante Bernarda. “E não atende à realidade de um campus universitário e das especificidades de trabalho numa instituição de ensino, pesquisa e extensão. Acaba papel e vive quebrando. Para o funcionário, é um problema, porque é obrigado a se deslocar para uma unidade mais próxima para bater seu ponto”.
Outra questão é o tempo gasto. “Não se leva em consideração o percurso que eu faço até chegar ao meu setor. Juridicamente, a partir do momento em que eu cheguei no campus, por exemplo, eu já estou no trabalho. Mas esse tempo de circulação que levo da entrada do campus até a minha unidade não é contabilizado. Muitas vezes esse é o atraso que acabo tendo que compensar de alguma forma. A mesma coisa é a questão da saída. Tenho que bater o ponto exatamente naquele horário, senão vou ficar devendo”, acrescenta Bernarda.
Assédio – O Sintuff, segundo Bernarda, sustenta que o ponto eletrônico é uma ferramenta de assédio moral. “Você depende da sua chefia para aceitar todo e qualquer acordo feito, não só para atender a uma necessidade pessoal, mas principalmente necessidade do setor”.
Se o funcionário, por exemplo, ficar um determinado dia depois do horário, a chefia pode até aceitar, mas, se ela não lançar isso no sistema, ele acaba perdendo essa hora. “Se a chefia não fizer isso previamente, que é o que acontece na maioria das vezes, o funcionário vai ter um saldo para descontar depois. Ele fica refém, porque depende de que a chefia honre a palavra e lhe dê essa hora, só que ela só pode te dar essa hora se tiver lançado no sistema”.
O funcionário tem de bater o ponto e a chefia tem que justificar toda vez qualquer imprevisto ou motivo alheio à vontade do servidor, como sair mais cedo por falta de luz e sem previsão de a energia voltar. “A chefia tem que entrar no sistema e justificar o motivo de o funcionário não poder bater o ponto, que ele não fique devendo hora e ter de pagar”.
A sindicalista avisa que são muitas as pendências, que somente são constatadas no dia a dia de uso do ponto eletrônico. E todo o prejuízo recai sobre o servidor. “Antes era tudo muito mais fácil de ser resolvido (as pendências, as ocorrências fora da rotina). Temos situações peculiares, como semanas acadêmicas, semanas de matrículas, do pessoal que trabalha no setor de pagamento, e por aí vamos fazendo ajustes. Muitas vezes o servidor, para facilitar a vida dele, acaba indo bater o ponto e voltando para terminar o serviço, para não perder o prazo, para não perder a pesquisa, para não prejudicar todo o andamento do setor. E muitas vezes ele não recebe por essa hora”.
Atuação do sindicato
Bernarda disse que o atual reitor Antônio Cláudio usou as 30 horas como campanha para se eleger e depois voltou atrás. A previsão de implantação do ponto eletrônico era dezembro de 2016, mas o sindicato conseguiu, com luta e organização da categoria, adiar, para que isso só ocorresse de fato em 2019.
“A instalação do ponto eletrônico começou no final de 2018, e assim mesmo não foi para toda a categoria de uma vez. Foi paulatinamente, em períodos e em um determinado departamento e uma determinada unidade. Antes da pandemia todos já estavam batendo ponto eletrônico biométrico. No momento estamos em trabalho remoto”, informou Bernarda.
“Somos uma categoria que não é favorável ao ponto eletrônico, mas não temos diálogo com a Reitoria, não temos uma mesa de negociação, que é uma de nossas lutas hoje. Nós tínhamos uma mesa permanente de negociação que o atual reitor acabou e encerrou o diálogo com o sindicato. Ele simplesmente não nos ouve”, lamentou Bernarda.
Como funciona
De acordo com Bernarda, os pontos eletrônicos da UFF são relógios digitais dispostos em várias unidades. As pessoas colocam seu dedo e têm que cumprir 40 horas semanais. No caso da UFF, somente os técnicos-administrativos em educação. Os docentes estão dispensados.
Os funcionários têm que compor 8 horas de trabalho com uma pausa de uma hora, que pode ser de quinze minutos. São dois blocos de 4 horas com quatro batidas no ponto. Entrada 1, saída 1, almoço obrigatório, entrada 2, saída 2.
Na pandemia – A dirigente disse que com a pandemia de Covid-19 os servidores da UFF passaram a constar no Sistema de Gestão de Pessoas (Sigepe) do governo federal como afastados, e não precisam bater o ponto. “Durante muito tempo tivemos todo dia de entrar lá e pedir uma justificativa. Agora, com a maioria em trabalho remoto, não se entra no sistema de ponto para justificar”, explicou.
Proposta do Sintuff
“A categoria está toda insatisfeita, ninguém concorda com o ponto eletrônico. Nossa proposta é a revogação da portaria do reitor como do ponto eletrônico, sob a alegação de que não é o método mais adequado para uma instituição de ensino, pesquisa e extensão. Na universidade tem uma série de situações que não têm como serem aferidas através de um ponto eletrônico, que tem um programa padrão. (Não tem como aferir) se fizermos algo muito específico e/ou detalhado, como no caso de um biólogo e um técnico de enfermagem. Realidade de trabalho e cargas horárias são diferentes. Um tem trabalho externo; outro não tem”, afirmou Bernarda.