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Área de veículos automotores caiu do segundo para o quarto lugar na receita líquida. Sudeste perde participação
Publicado 21/07/2022 – 15h41
Em um período de 10 anos, de 2011 a 2020, a indústria brasileira perdeu 9.579 empresas (3,1% do total). E eliminou 1 milhão de empregos, basicamente no setor de transformação. Os dados são de pesquisa anual divulgada nesta quinta-feira (21) pelo IBGE. Segundo o instituto, metade do corte se concentrou em três atividades: artigos de vestuário e acessórios (-258,4 mil), artigos de couro, para viagem e calçados (-138,1 mil) e produtos de metal (-134,2 mil).
Assim, em 2020, havia 303,6 mil empresas com um ou mais ocupados, sedo 297,3 mil na área de transformação e 6,3 mil indústrias extrativas. O setor tinha naquele ano 7,7 milhões de ocupados – 7,5 milhões na indústria de transformação e 200 mil nas empresas extrativas. A receita líquida, somada, chegou a R$ 4 trilhões, com pagamento de R$ 308,4 bilhões em salários e outras remunerações. E o salário médio era equivalente a três salários mínimos, ante 3,5 há 10 anos.
Confirmando o cenário geral de queda da indústria brasileira, o número de empresas diminuiu pelo sétimo ano seguido. O ponto mais alto da série foi 2013, com retração a partir do ano seguinte. Desde então, o total de indústrias caiu 9,4% e o de empregos, 15,3%.
Entre os segmentos, a indústria alimentícia tem 24,1% de participação, com crescimento de 5,9 pontos percentuais em 10 anos – e 3,6 apenas de 2019 para 2020. O setor concentra 1,758 milhão de empregados. A área de produtos químicos foi de 8,8% para 10,5%, saindo da quarta para a segunda posição. Já o setor automobilístico fez o caminho inverso, perdendo 4,9 pontos em 10 anos, de 12% para 7,1% de participação.
A região Sudeste teve a maior perda em 10 anos (menos 4,6 pontos percentuais), mas ainda concentra 56,3% do Valor de Transformação Industrial (VTI). A região Norte foi a que mais cresceu (2,5 pontos), para 9,3% do total, enquanto o Centro-Oeste subiu 1,7 ponto, para 6,3%. O Sul tem 18,7% (praticamente estável, com 0,2 ponto de variação), enquanto o Nordeste soma 9,5% (0,3 ponto m 10 anos).
“O avanço na participação das regiões Norte e Centro-Oeste pode ter sido influenciado pela indústria extrativa e a agroindústria, que foram menos prejudicadas pela crise sanitária”, observa a gerente de Análise Estrutural, Synthia Santana. A indústria paulista concentra 30,4% da produção e a mineira, 12,5%.
Um dia após o presidente Jair Bolsonaro reunir embaixadores para levantar suspeitas sobre o sistema eleitoral sem apresentar provas, o núcleo político que trabalha pela reeleição do atual titular do Palácio do Planalto tratar o assunto como “página virada”, nas palavras de um integrante do grupo. A ordem agora é aproveitar o anúncio de redução do preço da gasolina para virar a pauta negativa e embalar a convenção do PL que acontece no próximo domingo, no Rio.
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Bolsonaro se reuniu com cerca de 70 embaixadores e outros representantes diplomáticos no Palácio Alvorada ontem à tarde e reiterou os ataques às urnas eletrônicas e aos magistrados dos tribunais superiores. A nova investida gerou reações duras por parte dos presidentes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Edson Fachin, do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e presidenciáveis.
A péssima repercussão do evento foi discutida hoje em reunião do comitê de campanha. Segundo pessoas presentes à conversa desta terça, a ordem é evitar declarações sobre o caso, sobretudo críticas ao presidente, para tentar baixar a temperatura do assunto. Aliados do presidente têm tentado convencê-lo de que o assunto não atrai votos à reeleição, sem sucesso.
Participaram da reunião o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), coordenador da campanha; o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e os ministros Ciro Nogueira (Casa Civil) e Fabio Faria (Comunicações), além do ex-ministro da Defesa, Walter Braga Netto. A conversa teve a participação também da equipe da comunicação da campanha: o coordenador Fabio Wajngarten, o marqueteiro do PL, Duda Lima, e o publicitário Sergio Lima.
O encontro de Bolsonaro com diplomatas, como mostrou O GLOBO, foi considerado “desastroso” por integrantes do núcleo duro do titular do Palácio do Palácio do Planalto. Integrantes da campanha concordaram que não adianta mais confrontar o presidente sobre os ataques às urnas eletrônicas, mas tentar neutralizar os efeitos do discurso dele com os principais temas campanha.
A ideia é que Bolsonaro, ao cumprir a agenda de candidato, se concentre em bater na tecla do “pacote de bondades” que o governo foi autorizado a oferecer com a promulgação na semana passada da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Eleitoral.
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A proposta dribla a lei eleitoral e regras fiscais para permitir a distribuição de benesses a quatro meses do pleito. Ela permitiu o aumento do Auxílio Brasil para R$ 600 e do Vale-Gás para 120, além de criar benefícios para caminhoneiros e taxistas.
Outra estratégia definida durante a reunião passa por Bolsonaro reforçar o anúncio de redução do preço médio de venda de gasolina para as distribuidoras, feito pela Petrobras. Passará de R$ 4,06 para R$ 3,86 por litro, uma redução de R$ 0,20 por litro ou de 4,9%.
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Horas antes de a anunciar a alteração que vai impactar nas bombas no curto prazo, o presidente afirmou que a empresa ia “achar seu rumo” e que ia “começar a dar boa notícia”.
— Os caminhoneiros sofreram com aumento no combustível, foi no mundo todo. Acho que a Petrobras vai achar seu rumo agora, (com um) novo presidente. Vai começar a dar boa notícia para a gente – disse Bolsonaro a apoiadores, no Palácio da Alvorada.
Efeito Moraes
Já os membros do núcleo jurídico da campanha reconhecem o que classificaram como “exageros” no discurso de Bolsonaro. Na avaliação deles, porém, embora a reunião com embaixadores já estivesse agendada desde a semana passada, a decisão do ministro do TSE Alexandre de Moraes que obrigou bolsonaristas do presidente a retirarem do ar publicações que continham informações falsas sobre o pré-candidato a presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) inflou ainda mais os ânimos de Bolsonaro.
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O despacho de Moraes ocorreu no domingo e foi divulgado na segunda-feira, horas antes da reunião com embaixadores.
Para os aliados, a decisão não poderia ter sido tomada porque Moraes não é o responsável por analisar as ações envolvendo propaganda antecipada. O ministro, que é vice-presidente do TSE e atua interinamente como presidente, tomou a decisão no plantão do tribunal, porque os juízes responsáveis estão de férias.
jul 20, 2022
Por Fernanda Rodrigues
O desserviço prestado pelo editorial do Jornal O Globo revela a necessidade de discutir a fundo a importância do serviço público.
Em texto editorial publicado no dia 18 de julho, com o título “Descaso do funcionalismo revela urgência de reforma administrativa “, o Jornal O Globo defende a reforma administrativa e desrespeita os servidores públicos federais ao retratar de forma equivocada a realidade do serviço público brasileiro. O texto tenta deslegitimar a luta dos auditores fiscais e peritos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e dos auditores fiscais da receita federal.
A primeira acusação citada na matéria é de que os médicos do INSS não têm cumprido os prazos estabelecidos pela Procuradoria-Geral da República juntamente com o INSS em 2020. A matéria desconsidera completamente que no período questionado o país passava por uma pandemia que aumentou o número de solicitações e afastamento do trabalho e de concessões de auxílio-doença. Até julho de 2021, foram registradas pelo Ministério do Trabalho e Previdência 68.014 concessões, o que equivalia a 54,5% das liberações para segurados.
O editorial responsabiliza os servidores e não a falta de estrutura pública pelo fato de segurados não conseguirem agendar consultas de perícia médica, além de justificar que a fila de espera, de 1 milhão de pessoas, era resultado da greve dos médicos e da suspensão dos serviços na pandemia. Contraditoriamente às declarações do presidente da república, que desmereceu a gravidade da situação de pandemia no brasil, a suspensão de serviços nas fases mais críticas visou proteger os servidores e a população, não aumentando os casos de Covid19. As greves ocorridas no período refletiram o desmonte do serviço público nos últimos anos, trazendo a bandeira de mais investimentos, respeito e estruturas para que os trabalhadores essenciais e da saúde pudessem atender com agilidade e qualidade os desafios da pandemia. Culpabilizar os servidores pela situação caótica em que o país se encontrou nos períodos mais agudos da pandemia de Covid19 é desonesto e irresponsável.
Quando toca na luta dos auditores da Receita Federal, o editorial ironiza a exigência da categoria a reajuste, colocando de forma negligente informações incompletas sobre a possibilidade de aumentos ao funcionalismo. Nessa rápida acusação, o jornal propositalmente não comenta sobre o fato desta categoria se encontrar a mais de 5 anos sem reajuste salarial, apesar das diversas tentativas de negociação com o governo federal anteriores ao período eleitoral.
Quando ilustra de forma fantasiosa o que chama de “mundo singular do serviço público”, o editorial cita “estabilidade no emprego para todos e uma série de benesses de que ninguém jamais ouviu falar em empresas privadas” e diz que não existe garantia de qualidade no serviço prestado uma vez que não há promoções por mérito e aumento salarial. Se contradiz ao colocar como solução a PEC32, conhecida como reforma administrativa, que quer retirar do servidor a estabilidade, conceito primordial para a garantia de lisura e efetividade no trabalho prestado à sociedade, sem brecha para troca de favores, corrupção ou fraudes no fluxo operacional dos serviços.
O único detalhe colocado de forma correta no texto é que a Reforma administrativa foi barrada por pressão das categorias do funcionalismo público. Em 2021, a unidade das categorias de servidores públicos foi determinante para o recuo do governo na tramitação da PEC-32. O serviço público e o servidor, que tiveram seus papeis fundamentais evidenciados na pandemia, precisam de investimento, melhores condições de trabalho e respeito, e não de uma reforma administrativa que o precarize e desmonte cada vez mais.
Afastado do Ministério da Educação (MEC) desde final de março, e preso após operação da Polícia Federal em meados de junho, o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro é o pivô de um escândalo de corrupção de grandes proporções na pasta que comandava.
Envolvendo a mediação de pastores e, segundo o próprio Ribeiro, orientações diretas do presidente Jair Bolsonaro, o escândalo de corrupção no MEC sintetiza didaticamente a forma de atuação do Governo Federal, com o discurso falsamente moralista e ideologicamente inflamado, caminhando junto do saque dos cofres públicos e da troca de favores com a velha política.
Após reportagens que expuseram parte da rede de corrupção no MEC, investigações iniciais feitas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pela Controladoria Geral da União (CGU) estimam que R$ 31 bilhões de reais foram desviados dos cofres públicos em 2021.
Esse total inclui R$ 12,2 bilhões em irregularidades constatadas pelo TCU na prestação de contas do governo Jair Bolsonaro (motivo pelo qual as contas foram aprovadas com “ressalvas”) e R$ 18,8 bilhões mapeados por técnicos da CGU como distorções no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) – que está no centro do escândalo do MEC e é comandado por membros do partido ao qual Bolsonaro se filiou neste ano.
O Senado já aprovou o requerimento para instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o MEC, mas os governistas manobram para postergar as investigações para depois das eleições. O medo toma conta de Brasília.
Eles transformaram o Ministério da Educação em um grande balcão para negócios corruptos. Agora, estão apavorados. (Associação dos Professores do Paraná)
Dos 5 milhões de quilômetros quadrados da Amazônia Legal, quase 1,5 milhão não têm destinação informada pelo poder público. Essas “terras de ninguém” correspondem a quase um terço do bioma e podem cair na mão dos criminosos ambientais, caso uma política de ordenamento territorial não seja aplicada.
O alerta é do Relatório da Amazônia 2030, uma pesquisa feita pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). A pesquisa estima que aproximadamente 170 mil quilômetros quadrados de floresta constam de cadastros fundiários feitos por pessoas que se apresentaram como donas dessas terras, mas que na verdade são públicas.
Brenda Brito, pesquisadora do Imazon e autora do Relatório da Amazônia 2030, explica que já há mecanismos legais que permitem a destinação correta das terras, mas falta vontade política para colocar em prática o plano de reordenamento territorial.
“Considerando a Constituição federal e várias leis que incidem sobre a questão fundiária, a gente já tem leis existente para destinar as terras públicas de uma forma que iniba a grilagem, que é essa prática de ocupação ilegal. E, da mesma forma, que promova o uso sustentável e o reconhecimento dos direitos prioritários”, diz Brito.
Áreas devem ser destinadas a povos tradicionais
Segundo a pesquisadora, a prioridade na ocupação das áreas deveria ser principalmente de indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, mas também com destinação para Unidades de Conservação, como Florestas Públicas, áreas de agricultura familiar e outras atividades de cunho social.
O impacto positivo dessa mudança não seria válido apenas para os beneficiários diretos, mas sim para todo o planeta. grande parte do desmatamento ocorre nas terras não destinadas. O desflorestamento é uma das principais fontes de carbono, que vai para a atmosfera, potencializando o aquecimento global e as mudanças climáticas, segundo a pesquisadora do Imazon.
“Pensando em mudanças climáticas, o grande impacto seria realmente tentar conter esse desmatamento que é causado pela prática de grilagem de terras. A gente estima que 40% do desmatamento ocorra nesses territórios sem destinação fundiária, em média”, explica.
“Então é um indício de que essas áreas estão sendo de fato ocupadas visando a obtenção e a apropriação desse território. E é por isso que é importante que é a gente tenha essa destinação para retirá-las desse alvo da grilagem”, reafirma.
Destinação correta é questão de sobrevivência para ribeirinhos no AM
No rio Manicoré, no Amazonas, ribeirinhos que vivem na região há séculos cansaram de esperar o poder público promover a regularização das terras. No ano passado, o Brasil de Fato acompanhou o grupo durante uma expedição que documentou a extração ilegal de madeira, fruto da chegada do arco do desmatamento na região.
As evidências serviram para embasar um pedido de Concessão de Direito Real de Uso (CDRU), que foi entregue pelo governo do estado às comunidades. A conquista é um passo importante para a criação de uma Unidade de Conservação (UC) no local, reivindicação levantada pelos ribeirinhos há mais de 10 anos.
Jolemia Chagas, ribeirinha do rio Manicoré e pesquisadora da PUC, diz que a destinação correta das terras vai garantir segurança, saúde e educação aos extrativistas e agricultores da região.
“Para o Estado promover políticas públicas em territórios como nosso, a gente sabe que temos que demandar com muito mais força. Em unidades de conservação, isso funciona de forma mais eficaz, no sentido de Estado se comprometer. Esse é um direito das comunidades”, avalia.
Edição: Rodrigo Durão Coelho
Representantes terão conversa com senador Bernie Sanders e deputado que integra comissão que investiga invasão do Capitólio
Uma comitiva de representantes de entidades civis do Brasil viajará a Washington na semana que vem e terá encontros com autoridades dos Estados Unidos para conversar sobre o risco de golpe nas eleições presidenciais do Brasil.
O grupo tem reuniões previstas com o senador Bernie Sanders e com o deputado Jamie Raskin, que integra a comissão especial de investigação da invasão do Congresso americano em 6 de janeiro de 2021. Conversas com outras autoridades americanas também estão sendo marcadas.
Sanders foi pré-candidato à Presidência dos EUA em 2016 e 2020, pelo Partido Democrata. É considerado uma das vozes mais à esquerda da política americana.
Raskin, deputado por Maryland e membro do Partido Democrata, atua na investigação que tem revelado detalhes sobre a organização da invasão ao Capitólio, quando apoiadores do ex-presidente Donald Trump tentaram reverter à força a derrota do republicano nas urnas.
A comitiva incluirá representantes de entidades como Artigo 19, Conectas, Comissão Arns, Greenpeace Brasil, ABGLT, Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas) e Geledés (Instituto da Mulher Negra).
A viagem está sendo organizada pelo WBO (Washington Brazil Office) e, de acordo com organizadores, tem como objetivos tratar das ameaças ao processo eleitoral brasileiro e pedir um posicionamento firme em relação ao respeito ao resultado da votação, seja quem for o vencedor.
“O mundo inteiro acompanha com atenção as eleições presidenciais do Brasil. Nos EUA, há uma sensibilidade ainda maior, por causa das tentativas de subversão do processo eleitoral americano em 2020 e da invasão ao Capitólio em 2021. As organizações brasileiras têm muito a dizer e a ouvir nessa série de encontros”, diz Paulo Abrão, diretor-executivo do WBO.
Bolsonaro tem colocado em dúvida a credibilidade do sistema eleitoral brasileiro, como fez Trump: antes da eleição, o republicano tentou plantar diversas dúvidas sobre a segurança da votação. Depois que a apuração mostrou vitória do democrata Joe Biden, o republicano tentou de diversas formas reverter o resultado, inclusive coagindo funcionários que organizavam as eleições, mas sem conseguir. Biden tomou posse em 20 de janeiro de 2021.
Nesta segunda, o presidente brasileiro voltou a questionar o sistema eleitoral brasileiro e a fazer ameaças golpistas, desta vez em um encontro com embaixadores em Brasília.
Publicado: 20 Julho, 2022 – 09h54 | Última modificação: 20 Julho, 2022 – 10h24
Escrito por: Andre Accarini | Editado por: Marize Muniz
A não correção da tabela do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) ao longo dos anos vem ‘comendo’ cada vez mais os salários dos trabalhadores. A cada reajuste salarial conquistado, na maioria dos casos depois de muita mobilização e luta, aumenta também o número de trabalhadores que perdem a isenção ou passam a pagar mais imposto porque ‘progridem’ de faixa. Isso preocupa dirigentes de sindicatos durante as campanhas salariais que buscam repor o poder de compra, seja com reajustes igual à inflação da data-base, seja com aumento real, ou seja, acima da inflação do período.
Apesar das promessas, feitas inclusive durante a campanha eleitoral, e outra vez, em 2019, quando disse que a faixa de isenção passaria dos atuais R$ 1.903,98 para R$ 3 mil, o presidente Jair Bolsonaro (PL) manteve a tabela congelada. E se não for corrigida, em 2023, até quem ganha um salário mínimo e meio vai pagar imposto de renda.
Ao não cumprir as promessas, Bolsonaro está tirando comida da mesa dos trabalhadores e das trabalhadoras que, desde setembro do ano passado, enfrentam inflação superior a dois dígitos, com vários recordes de aumentos nos preços dos alimentos.
Se houvesse a correção da tabela, os descontos nos contracheques seriam menores e, dependendo da faixa salarial, os trabalhadores estariam isentos. Hoje, um trabalhador que ganha R$ 4.702,83, sem dependentes, paga mensalmente R$ 310,73 de Imposto de Renda porque está enquadrado na alíquota mais alta da tabela que é de 27,5%. Se a tabela fosse corrigida, ele estaria isento porque o salário tributável seria R$ 4,6 mil.
“Se a tabela tivesse sido corrigida, como deveria ser, esse valor ficaria nas mãos do trabalhador e contribuiria bastante com o orçamento mensal. No caso do exemplo acima, em um ano o trabalhador economizaria R$ 3.720”, explica a técnica da subseção do Dieese da CUT Nacional Adriana Marcolino.
“O governo brasileiro está se apropriando cada vez mais da renda dos trabalhadores e das trabalhadoras, ampliando a desigualdade tributária”, critica Adriana.
Tabela no IR e as mesas de negociação
Em fase de negociações salariais, representantes dos trabalhadores têm ficado ainda mais atentos ao tema, querem conquistar reajustes para suas categorias profissionais e também a correção da tabela do Imposto de Renda.
Este é o caso dos bancários, cuja negociação em âmbito nacional está em andamento. A categoria definiu como índice de reajuste a ser negociado com a bancada patronal a reposição da inflação da data-base. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumula alta de 11,89% em 12 meses. Os bancários lutam ainda por mais 5% de ganho real.
“Na Campanha Nacional dos Bancários, esse ano, nós queremos aumento real e, conquistando esse reajuste, como ocorreu em anos anteriores, os bancários vão passar para outra faixa de contribuição, pagando mais imposto”, diz Juvandia Moreira, presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Ramo Financeiro (Contraf-CUT) e uma das coordenadoras do Comando Nacional dos Bancários.
Ela reforça que a solução é conseguir o reajuste salarial, mas também exigir a correção da tabela.
Nós temos que ter a correção da tabela do Imposto de Renda. O compromisso tem que ser cumprido. Essas duas lutas são fundamentais – ter reajuste salarial e ter reajuste da tabela do imposto, para que a gente pague menos impostos
No caso dos metalúrgicos do ABC, outra categoria que está em campanha salarial, os trabalhadores também podem pagar mais imposto caso a tabela do IR permaneça sem correção.
“Com a inflação que tivemos nos últimos dois anos, os reajustes salariais tendem a ser maiores e, se não há a correção da tabela do Imposto de Renda, fica muito mais fácil o trabalhador sair de uma faixa de alíquota para outra e quando isso ocorre, paga-se mais imposto”, critica Luiz Carlos da Silva Dias, o Luizão, diretor-executivo do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (SMABC).
O trabalhador pode sair da faixa dos 15% e passar para a de 22,5%, por exemplo. Assim, todo o reajuste conquistado para recompor o salário, o poder de compra, quem come é o imposto de renda. Se a tabela fosse corrigida, esse trabalhador continuaria na mesma alíquota e teria aumento real de salário
Não corrigir a tabela é retirar, “literalmente”, os recursos dos trabalhadores, acrescenta o dirigente.
Confira as alíquotas do Imposto de Renda
Atualmente, quem ganha até R$ 1.903,98 é isento e não paga imposto de renda. Quem ganha mais já entra na tabela, que é gradativa e tem alíquotas que vão de 7,5% a 27,5%, mesmo percentual para quem ganha mais de R$ 4.664,68. Como é a alíquota máxima, mesmo quem ganha R$ 50 mil paga 27,5% de IR.
Veja tabela:
O objetivo do reajuste da tabela é aumentar as faixas de desconto conforme os índices inflacionários para que os reajustes salariais não sejam impactados pelo imposto da forma injusta como é atualmente, que pode impactar até os trabalhadores que ganham um salário mínimo e meio no ano que vem.
De acordo com um levantamento feito pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais (Sindifisco Nacional), somente de janeiro de 2019 a junho de 2022, a defasagem da tabela foi de 26,57%, muito além dos 2,48% registrados durante o período de 2007 e 2010, no segundo mandato do governo Lula.
No acumulado desde 1996, a defasagem ultrapassa os 147%. Uma simulação feita pela entidade mostra como ficaria a tabela de IR com a correção da defasagem. Veja na imagem.
Comparação entre governos
O levantamento do Sindifisco Nacional também analisou a defasagem nos mandatos presidenciais. A defasagem nunca foi tão alta quanto nos dias de hoje, no mandato de Bolsonaro, que ainda não chegou ao fim.
A maior defasagem até então, tinha sido registrada no segundo governo de FHC, entre 1999 e 2002. “Em seu segundo mandato administrou a maior inflação do período, em torno de 40%, mas não teve tanta defasagem, pois realizou a correção da tabela em 17,5% em 2002, chegando no total de 18,99%”, aponta o levantamento.
Defasagem da tabela do IR (corrigida pelo IPCA)
(Fonte: Brasil Econômico)
Empossado após prometer reduzir a carga tributária do Brasil, Jair Bolsonaro (PL) está prestes a se tornar o primeiro presidente eleito do país desde 1989 a não reajustar a tabela de cobrança do Imposto de Renda (IR). Sem correção, essa tabela acumula defasagem de 26,5% durante seu governo – maior percentual já registrado.
O cálculo foi feito pelo Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco Nacional) e leva em conta os três anos e meio desde de a posse de Bolsonaro.
Segundo o Sindifisco, faltando seis meses para o final do mandato do presidente, essa defasagem ainda tende a aumentar, já que a inflação segue na casa dos 10%. Isso fará com que o IR passe a ser cobrado também de quem recebe baixos salários.
A tabela do imposto estabelece faixas de renda para definir quem precisa ou não pagar imposto no Brasil. Hoje, pessoas que ganham até R$ 1.903 por mês ou R$ 22.847 por ano são isentas do IR pela Receita.
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Esse valor está vigente desde 2015. De lá pra cá, os preços aumentaram. Os salários foram reajustados para tentar compensar a inflação – inclusive o salário mínimo. O trabalhador brasileiro, naturalmente, passou a ganhar um valor nominal maior – ainda que o poder de compra tenha caído.
Sem a correção da tabela do IR, milhões desses trabalhadores que eram considerados isentos em 2015 hoje passaram a ter de pagar impostos. Quem explica isso é Grazielle David, colaboradora da Tax Justice Network, entidade que atua por justiça fiscal e social.
“Como salário normalmente é reajustado pela inflação, quando você não reajusta também o valor mínimo para pagamento para isenção do Imposto de Renda, você acaba fazendo com que pessoas que não pagavam o imposto passem a ter que pagar só porque ela teve um reajuste inflacionário do que o salário”, disse ela.
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4,7 milhões de afetados
A Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco) estimou no início do ano o número de cidadãos que deixariam de pagar IR caso a tabela do tributo tivesse sido reajustada durante o governo Bolsonaro: 4,7 milhões.
Sem o reajuste, de acordo com a Unafisco, o governo vai arrecadar R$ 287 bilhões com o IR referente a 2022. Desse total, R$ 47 bilhões – ou 16% – serão arrecadados somente porque a tabela não foi corrigida.
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Mauro Silva, presidente da Unafisco, considera essa arrecadação adicional indevida, pois ela é fruto da defasagem. Aponta ainda uma contradição do governo Bolsonaro, que prometeu não só reduzir a carga tributária como, especificamente, revisar a tabela do Imposto de Renda.
“Esse governo foi exatamente o que mais promoveu aumento de Imposto de Renda para a classe média quase pobre já que não reajustou a tabela do Imposto de Renda”, criticou Silva. “Ele promoveu um aumento brutal da carga tributária.”
De acordo com o Sindifisco, levando em conta o salário mínimo de R$ 1.112 vigente hoje, quem recebe 1,57 salário mínimo por mês já deve pagar imposto de renda. Em 2018, ano em que Bolsonaro foi eleito, só pagava IR quem recebia mais que dois salários mínimos.
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Defasagem histórica
Silva ressaltou que a defasagem da tabela do IR é histórica. Em 1996, no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), a tabela parou de ser corrigida com frequência. Passou a acumular diferença ante à inflação.
De lá para cá, são 147,37% de defasagem. Caso ela fosse corrigida por esse índice, pessoas que ganham até R$ 4.670 seriam isentas hoje.
Atualmente, um contribuinte que ganha R$ 5 mil por mês paga R$ 505 de IR. Se tabela fosse corrigida, ele pagaria R$ 24,73 – diferença de 1.944%
::Como Bolsonaro desfigurou o orçamento para se manter no poder::
De 2005 a 2015, durante os governos dos petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, a tabela chegou a ser corrigida periodicamente. Mesmo assim, a correção não compensou o índice acumulado de aumentos de preços no país.
Durante o governo Bolsonaro, entretanto, a defasagem atingiu nível recorde, segundo o Sindifisco. Isso acabou onerando os mais pobres.
Defasagem da tabela do IR ante ao IPCA:
• 1996 a 1998 (FHC 1): 17,19%
• 1999 a 2002 (FHC 2): 18,99%
• 2003 a 2006 (Lula 1): 7,92%
• 2007 a 2010 (Lula 2): 2,48%
• 2011 a 2014 (Dilma 1): 6,53%
• 2015 (Dilma até início do processo de impeachment): 4,80%
• 2016 a 2018 (Temer): 9,42%
• 2019 a primeiro semestre de 2022 (Bolsonaro): 26,57%
“Quando não temos a correção da tabela, o tributo acaba atingindo em cheio os mais pobres, que perderam seu poder de compra ao longo do período”, disse o presidente do Sindifisco Nacional, Isac Falcão. “Não corrigir a tabela é uma forma de aumentar o imposto para essa numerosa parcela da população que, além de arcarem com o IR, precisam também lidar com os tributos indiretos, que incidem sobre o consumo.”
A correção da tabela pode ser feita via Medida Provisória ou Projeto de Lei encaminhado ao Congresso. O governo Bolsonaro encaminhou um projeto propondo a correção em 2021. Esse projeto incluía a mudança em outros impostos e não avançou.
Edição: Thalita Pires