Por Rafael dos Santos Pereira*

A natureza do trabalho na universidade é essencialmente educacional! Isso significa que produzimos educação, e a educação, tal como nós produzimos na universidade, não pode ser mensurada, reduzida em indicadores quaisquer que sejam. Os indicadores podem existir, e existem aos montes, mas eles não dão conta da totalidade do processo educativo e muito menos do fenômeno social, educacional e econômico que nosso trabalho produz. Qualquer ação nesse sentido é reduzir e limitar a contribuição da universidade para a sociedade.

A qualidade do trabalho do TAE vem do seu compromisso institucional e da sua motivação em cumprir suas responsabilidades com o público

No caso do trabalho dos Técnicos-Administrativos em Educação, é um contrassenso achar que mensurar o trabalho e a sua contribuição profissional através da contagem de tempo da carga-horária com um ponto eletrônico vai gerar melhor desempenho ou melhores resultados. A qualidade do trabalho do TAE vem do seu compromisso institucional e da sua motivação em cumprir suas responsabilidades com o público. É impossível mensurar compromisso, dedicação e motivação com um ponto eletrônico. Parece óbvio, mas é preciso dizer: um trabalhador motivado e reconhecido em sua missão como servidor público pode “produzir” muito mais do que um trabalhador cuja motivação é cumprir seu horário para, por exemplo, não ter estresse no setor ou não perder rendimentos.

A implantação do controle de carga-horária por ponto eletrônico é baseada em duas premissas que não contribuem para a melhoria do trabalho. A primeira é expressão da visão gerencialista que hegemoniza a administração Universitária, a qual pauta sua ação pelo controle com vistas no mito da eficiência administrativa, a qual considera erroneamente que o trabalhador estar sentado 8 horas por dia em sua estação de trabalho o fará produzir mais, transpondo uma lógica empresarial e industrial para uma instituição pública educacional. A segunda premissa, também oriunda do ideário gerencialista, é a ideia de que o servidor público é preguiçoso e tende a burlar regras e fugir do trabalho, então precisa de um “cabresto” para não fugir! Ambas as premissas são negativas, e suas consequências não têm como ser positivas para a instituição, afinal, que trabalhador gosta de ter uma política institucional que o carimba como ineficiente e preguiçoso?

…o registro e controle de frequência e assiduidade, tanto de TAEs como de Docentes, pode ser realizado com ferramentas transparentes baseadas no planejamento

A adoção do ponto eletrônico para controlar a jornada de trabalho dos TAEs contribui para um clima de desconfiança e subalternização a partir do controle; diferenciação ocupacional na instituição (docentes que ocupam a maior parte das posições de direção na IES não têm nem ponto em papel) e não garante produtividade nem eficiência (nenhuma política gerencialista entregou o que prometeu desde a reforma do MARE, iniciada em 1995).

Penso que o registro e controle de frequência e assiduidade, tanto de TAEs como de Docentes, pode ser realizado com ferramentas transparentes baseadas no planejamento, registro e relatório de trabalho, que poderiam ser submetidos ao controle social e colegiado, respeitando a gestão democrática prevista na LDB 9394/96. Dessa forma é possível, por exemplo, contemplar as centenas de fazeres que existem numa universidade. Esse formato alternativo ao controle quantitativo e coercitivo do relógio de ponto biométrico me parece mais condizente com a natureza da universidade pública como instituição social, e do trabalho realizado nela.

*Rafael dos Santos Pereira, Técnico-Administrativo em Educação (Pedagogo) na UFSC, Doutor em Educação pela UFPR, pesquisa Políticas Educacionais em Ensino Superior. Foi Diretor da Fasubra entre 2015 e 2019. Autor no livro “A universidade eficiente no Brasil: reflexões sobre a política nacional de avaliação e a gestão universitária” (Enunciado Publicações, 2020).